Líder do União Brasil na Câmara dos Deputados, Pedro Lucas Fernandes (MA) diz que decisão de recusar o convite para comandar o ministério das Comunicações do governo Lula (PT) foi “a mais sensata para o momento” diante da possibilidade de que a bancada de seu partido, com 59 deputados, entrasse em uma guerra interna.
“Acho que contribui mais [para o governo] ter essa tranquilidade [nas votações] do que eu ir para o ministério por vaidade”, disse em entrevista exclusiva à Folha.
“Fui convidado, mas não poderia deixar a minha bancada em guerra, que isso não iria ajudar o governo”.
Pedro Lucas chegou a ser anunciado como substituto de Juscelino Filho, após o colega de partido deixar o ministério ao ser denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por suposto desvio em emendas parlamentares. Mas depois decidiu ficar na Câmara, o que causou um constrangimento ao expor a fragilidade do governo.
“Prefiro não acreditar que ele [Lula] esteja irritado com isso. Acho ele um presidente experiente, que sabe como são as relações dentro do Congresso e sabe o que é ser um partido plural. O PT é um partido com várias correntes, em que há disputa interna e não é diferente do União Brasil, não é?”, diz.
Qual o motivo de o senhor recusar o convite para o Ministério das Comunicações?
Eu fico muito honrado de ter sido convidado pelo presidente Lula. Independente de qual governo, quem aqui na Câmara dos Deputados não quer ser ministro? Ainda mais no meu estado [Maranhão], ser ministro de um governo de esquerda vale muito. Mas a liderança também é uma função muito importante no Congresso. Passamos por um processo de fusão [do DEM e PSL] que teve muita instabilidade política. Houve uma briga muito pesada do antigo presidente do União Brasil [Luciano Bivar] com o presidente [Antonio] Rueda e nós conseguimos finalmente pacificar a liderança. Quando surgiu a notícia de que eu poderia ir para o ministério, gerou muita disputa e muita gente na minha bancada pediu que eu ficasse.
A ponto de o senhor recusar o ministério?
Não houve uma recusa. Houve, sim, muito diálogo interno. O que eu falei para o presidente Lula [na reunião em que o convite foi feito] é que eu iria construir internamente. O [presidente do Senado] Davi [Alcolumbre] botou o nome do Juscelino para líder [do partido na Câmara] e eu saí com a missão de construir. Mas teve muita dificuldade, com outros querendo ocupar o espaço de líder. Então o melhor, o mais sensato neste momento, foi continuar na liderança. Foi uma decisão muito tranquila.
O governo não entendeu assim e viu a recusa como um constrangimento.
Não existe nenhum tipo de ruído. O presidente Lula é muito maduro [politicamente]. O vice-presidente [Geraldo] Alckmin também. Tanto é que já declarou que entendeu a nossa posição diante da bancada. O União Brasil tem uma bancada importante e plural, então a construção em torno de pautas convergentes é o mais importante para o governo.
É mais importante continuar como líder do que virar ministro?
Acho que contribui mais ter essa tranquilidade [nas votações] do que eu ir para o ministério por vaidade. Quero construir um Brasil melhor e um partido mais convergente com pautas que possam realmente desenvolver as políticas públicas.
O senhor falou com o presidente Lula depois da decisão?
Vou ter oportunidade de falar com ele, creio que hoje ainda a gente conversa.
Dizem no governo que ele ficou muito irritado porque, na reunião, o senhor indicou que aceitava ser ministro, mas depois recusou.
Prefiro não acreditar que ele esteja irritado. Acho ele um presidente experiente, que sabe como são as relações dentro do Congresso e sabe o que é ser um partido plural. O PT é um partido com várias correntes, em que há disputa interna e não é diferente do União Brasil, não é?
Mas a ministra Gleisi Hoffmann, da SRI [Secretaria de Relações Institucionais], anunciou o senhor como ministro. Ela errou ao antecipar o nome?
Não quero acusar a ministra Gleisi disso. Ela tem dado demonstrações de muita firmeza na SRI. Como ex-presidente do PT, ela dialoga com qualquer partido em nome do presidente. Não vejo como erro, não. Mas talvez a gente devesse ter feito o exercício anterior: primeiro eu construir o nome do Juscelino na bancada e depois anunciar. Tentei até o último momento, mas houve disputa muito grande.
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Um deputado recusar assumir um ministério para continuar na Câmara é muito raro. Isso mostra que hoje estar no Executivo perdeu prestígio e o Congresso está muito forte?
A política é muito dinâmica. A cada legislatura muda muito a forma de fazer política e o diálogo. Talvez eu tenha sido o primeiro, mas não serei o último, não é?
Mas é um enfraquecimento do Executivo?
A relação tem que ser transparente, como foi. Fui convidado, mas não poderia deixar a minha bancada em guerra, que isso não iria ajudar o governo. Ajudo muito mais acalmando minha bancada do que indo. Não foi nenhum tipo de ingratidão. Deixei claro que, se não conseguisse, não seria ministro.
O governo falava em retaliação pelo constrangimento. O partido perderá espaço para o PSD?
Não acredito. É claro que, em algumas pautas de costumes, não dá para acompanhar, mas, em termos nominais, entregamos muitos votos, somos a terceira maior bancada da Câmara. Vejo que o partido poderá contribuir ainda muito, faremos gestos importantes, e o governo vai entender isso. Não é por conta da entrada ou saída de um ministro que vai afetar a relação.
O partido tem 59 deputados. Quantos de fato apoiam o governo?
Como os outros partidos de centro, temos uns 20% que são contra o governo e uns 20% que votam, mas depende de qual é a pauta. E mais da metade vota a favor.
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Mais de 40 deputados do partido assinaram o requerimento de urgência para o projeto da anistia. Isso não mostra uma atuação dúbia?
Eu pessoalmente não assinei, vale ressaltar isso, porque entendo que não é uma pauta que converge. O presidente [da Câmara] Hugo [Motta] é quem tem o poder de pautar e são os partidos de centro que darão essa solidez para ele decidir.
O governo dizia que só teriam espaço na reforma ministerial partidos que estivessem com o Lula em 2026. Quando o partido vai decidir sobre a reeleição ou rompimento?
Dois mil e vinte seis tem que ser tratado em 2026. Estamos apoiando hoje a pauta do Brasil, e quem sabe a gente possa apoiar o Lula. Somos um partido de centro, que dialoga com todas as correntes e não podemos fechar a porta para ninguém. Temos o governador [Ronaldo] Caiado com sua pré-candidatura, mas também temos um presidente do Congresso muito alinhado com o Lula. O [ex–presidente] Tancredo Neves tem um ditado: temos que atravessar o rio, mas para que tirar o sapato antes? Tira na hora que for atravessar.
Raio-X – Pedro Lucas Fernandes, 45
Deputado federal em segundo mandato, é líder do União Brasil na Câmara dos Deputados. Filho do ex-deputado e atual prefeito de Arame (MA) Pedro Fernandes, ele foi vereador em São Luís e presidente da Agência Executiva Metropolitana no governo Flávio Dino.
Fonte ==> Folha SP