Autor fala sobre reta final de ‘Guerreiros do Sol’ – 30/07/2025 – Thiago Stivaletti

Foto de Thiago Stivaletti

(Atenção: o texto a seguir tem spoilers de “Guerreiros do Sol”)

O público que aguarda os cinco novos capítulos de “Guerreiros do Sol” toda quarta-feira no Globoplay foi pego de surpresa na semana passada, quanto um(a) personagem importante saiu de cena 15 capítulos antes de a novela terminar.

Em entrevista ao F5, George Moura, autor da novela ao lado de Sérgio Goldenberg, explica que a trama do cangaço entrou agora em seu terceiro ato, em que as mulheres tomam a frente da narrativa.

Nos últimos dez capítulos, o público verá o acerto de contas que Rosa (Isadora Cruz) e Jânia (Alinne Moraes) vão promover contra o megavilão Arduíno (Irandhir Santos), responsável por um banho de sangue sem precedentes na história das novelas. Depois da queda do bando de homens, será a vez de as mulheres se organizarem num bando feminino dedicado a fazer mais justiça do que vingança.

Moura e Goldenberg leram mais de 30 livros sobre o cangaço e passaram um ano escrevendo os 45 capítulos de “Guerreiros do Sol”. Entre os achados da pesquisa, está uma biografia raríssima de Lampião, escrita por um padre de nome Frederico Bezerra Maciel –tão longa que foi publicada em cinco volumes nos anos 80. Uma vez terminado o texto da novela, foram mais oito meses de gravação, com boa parte das locações externas no Nordeste, e mais seis meses de edição.

Ainda colhendo a boa repercussão crítica da novela, Moura já prepara seus novos projetos para a Globo. No momento, ele faz a supervisão do roteiro de um telefilme livremente inspirado na novela “A Viagem” (1994), em reprise no Vale a Pena Ver de Novo; e uma nova série que se passa no meio rural do Centro-Oeste e ambientada nos dias de hoje.

Como foi a decisão de eliminar um personagem importante bem antes do fim? Houve algum medo da reação do público?

Moura: A morte de um personagem principal é uma escolha ousada na tradição da novela. Mas acho que é bom quando você surpreende o espectador. Eu também gosto de ser surpreendido. Não fizemos isso por puro exibicionismo, para criar um evento a qualquer custo.

Eu e Sérgio tivemos a ideia juntos, e claro que deu um frio na barriga. Mas isso é essencial para a criação. Não acredito em arte e dramaturgia que não tenha risco. Hoje, com o excesso de concorrência e os orçamentos mais reduzidos [na TV e no streaming], a margem de risco tem sido cada vez menor. Mas temos a exata noção do público que queremos atingir, também sabendo que ‘Guerreiros’ vai ser exibida na TV aberta. A reação nas redes sociais foi esplêndida.

O que o público pode esperar dos dez últimos capítulos de “Guerreiros do Sol”?

Moura: Eu e o Goldenberg concebemos a história de ‘Guerreiros do Sol’ em três grandes atos. O primeiro vai até o capítulo 15, quando os cangaceiros invadem a casa do coronel Elói, e Rosa e outras mulheres entram para o cangaço. Até ali, temos o desabrochar do amor de uma sertaneja, que tem um casamento turbulento com um coronel e se apaixona por um homem que ingressa no cangaço para sobreviver.

No capítulo 31, temos a grande morte inesperada. A partir dali, o que já estava dado desde o início, a narração de Rosa como contadora dessa história, se torna mais efetivo porque as mulheres tomam as rédeas. Elas não querem reproduzir aquele modelo de bando, pois perceberam que aquele é o caminho da morte e não da vida. Como Rosa pode percorrer esse caminho em direção à vida, e não à morte?

Agora, nos últimos capítulos, o cangaço não sai de cena; as mulheres é que entram na cena do cangaço pela necessidade de formar um bando exclusivamente feminino para a uma missão. A missão de Josué era buscar a justiça com as próprias mãos contra um vizinho mais rico e opressor. Já Rosa quer sua filha de volta. Para isso, ela entra em confronto com o maior inimigo dela e de Josué: Arduíno, o homem que roubou sua filha.

Vocês tomaram muitas liberdades em relação à história de Lampião e Maria Bonita?

Moura: Quando eu e Sérgio começamos a escrever esse projeto, pensamos mesmo em contar a história dos dois. Mas com uma novela de 45 capítulos, percebemos que as amarras biográficas poderiam limitar os movimentos dos personagens. Então, fizemos uma escolha ficcional. Rosa e Josué têm destinos diferentes de Maria Bonita e Lampião.

É preciso lembrar que a maioria das mulheres entrava no cangaço de forma obrigada. Um grande exemplo é Dadá, que foi sequestrada e violentada por Corisco, teve uma hemorragia horrível e sobreviveu por um milagre. Diferente dela, Maria Bonita é uma das únicas mulheres que escolheu ir para o cangaço por conta própria.


Nas redes, o público não cansa de elogiar o trabalho do Irandhir Santos como o vilão Arduíno, o caçador de cangaceiros. O que ele agregou ao personagem?

Moura: Irandhir é um ator extraordinário. O Arduíno ultrapassa todos os limites, é o maior vilão que eu já escrevi. Mas, por pior que ele seja, o Irandhir consegue dar uma humanidade, uma verossimilhança ao que encarna. A gente não duvida nem um minuto que ele seja mesmo aquilo ali.

Um exemplo do gênio do Irandhir é a coleção de anéis que o Arduíno tira de suas vítimas. Isso foi ganhando destaque nas cenas por conta do trabalho dele. O Arduíno transforma em ouro o que ele mata. Isso é de uma perversidade muito louca. Ele é uma pessoa que monetiza a morte. Isso é forte e atual, porque hoje o dinheiro manda em tudo, até na vida das pessoas.

Outra característica do Arduíno é que, entre quatro paredes, com as suas mulheres, ele se torna até um homem com algumas fragilidades. Já em campo, na terra árida, ele é um monstro implacável.


E como será a ascensão política de Jânia (Alinne Moraes)? Isso aconteceu nos anos 30 no Nordeste ou na novela estamos no terreno da utopia?

Moura: Houve uma figura histórica, Nísia Floresta (1810-1885), do Rio Grade do Norte, que foi uma das pioneiras da luta feminina no Nordeste. Essa luta pelo voto feminino realmente aconteceu entre as mulheres sertanejas, mas trouxemos isso para um território livremente inspirado em fatos reais.

A Jânia tem um pouco de Nísia Floresta. A Alinne trouxe uma verdade incrível para a Jânia, uma mulher de grande firmeza e ao mesmo tempo uma doçura na relação afetiva com a Otília (Alice Carvalho), que é o inverso da aridez do seu casamento com o Idálio (Daniel de Oliveira).

Tomamos algumas licenças poéticas, como as reuniões de mulheres com panfletos, para apresentar melhor o assunto ao público. Num dado momento, a Jânia viaja e é recebida pelo Presidente da República, que sanciona a sua luta. Isso dificilmente teria acontecido na época.

E o que mais já podemos saber sobre essa reta final da novela?

Moura: Agora, as mulheres se juntam não só com a missão de resgatar Maria, a filha de Rosa, da mão de Arduíno, mas também se movimentam para se libertar do jugo dos homens em outros aspectos. Isso vai acontecer, por exemplo, no cabaré em que Arduíno explora mulheres.

De resto, o público vai descobrir a resposta a muitas perguntas. A Jânia vai se candidatar e vencer Arduíno? Ele vai morrer, ser preso ou ficar solto? Alguma das pessoas que ele machucou vai conseguir se vingar dele? Ou a maior morte, para um homem como ele, é permanecer vivo?

“Guerreiros do Sol”

Cinco novos capítulos nesta quarta (30), no Globoplay

Últimos capítulos em 6 de agosto

Foto de Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Foi repórter na Folha de S.Paulo e colunista do UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow)



Fonte ==> Folha SP

Leia Também

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *