Baratas do crédito são risco sistêmico? Entenda – 17/10/2025 – Mercado

Placa de bronze com inscrição

O JPMorgan Chase registrou uma baixa contábil de US$ 170 milhões no segundo trimestre, decorrente da falência da financeira de automóveis subprime Tricolor. “Cometemos erros”, observou o CEO Jamie Dimon no início da semana. Mas ele previu que nem ele nem seu banco ficariam sozinhos por muito tempo. “Minha antena se ergue quando algo assim acontece. E provavelmente não deveria dizer isto, mas, quando se vê uma barata, é provável que existam outras… todos deveriam ficar atentos a isso.”

A metáfora da barata já era conhecida, mas virou o clichê do momento depois que Dimon a usou.

Tricolor e a fornecedora de autopeças First Brands foram os dois primeiros insetos a aparecer. E, como Dimon previu, mais duas criaturas desagradáveis saíram debaixo da geladeira. Na quarta-feira (15) à tarde, o Zions Bancorp revelou em um documento regulatório que “recentemente tomou conhecimento de supostas deturpações e inadimplências contratuais” de dois tomadores corporativos que não responderam às solicitações subsequentes do banco, e anunciou uma baixa de US$ 50 milhões nesses empréstimos.

Na quinta-feira (16), outro banco de porte médio, o Western Alliance, informou que havia aberto, em agosto, um processo por fraude contra um de seus clientes de crédito imobiliário comercial. O banco afirmou acreditar que as garantias cobriam o valor do empréstimo, mas o mercado não esperou pelo laudo de um corretor. As ações tanto do Zions quanto do Western Alliance despencaram.

O mercado mais amplo reagiu também. Não apenas as ações de bancos caíram, arrastando consigo o mercado em geral, como o rendimento dos títulos do Tesouro americano de dois anos recuou acentuadamente e o índice do dólar enfraqueceu. Tudo isso sugere que o mercado passou a precificar a possibilidade de que as “baratas” indiquem um problema mais amplo, seja no sistema financeiro, seja na economia —algo a que o Federal Reserve poderia ter de responder cortando os juros mais rápido do que o esperado.

(Vale notar que o nervosismo pode não se dever apenas aos “insetos” do crédito: na quinta-feira (16), um ou mais bancos recorreram pela segunda vez consecutiva à linha permanente de recompra do Fed, ação rara que sugere falta de liquidez no mercado monetário e pode ter contribuído para o clima tenso.)

Um comentarista financeiro que prevê que uma crise sistêmica não é iminente precisa ter um certo gosto pelo risco. Se errar, é o tipo de engano que as pessoas não esquecem, ao contrário das previsões catastróficas, rapidamente esquecidas quando se mostram falsas. Mas tentamos seguir as evidências e, até agora, elas indicam que as falências recentes são, em grande parte, casos idiossincráticos de um mercado de crédito aquecido, e não sintomas de um problema econômico ou sistêmico mais profundo.

Mantendo a metáfora entomológica: haverá mais avistamentos de baratas, mas cupins ainda não parecem ter corroído os alicerces.

Por um lado, as quebras da Tricolor e da First Brands, assim como os empréstimos problemáticos no Zions e no Western Alliance, estão todos ligados a alegações de fraude, e fraude não é necessariamente, nem geralmente, um fenômeno sistêmico. “Nos últimos anos, houve um aperto relevante dos spreads de crédito e dinheiro demais perseguindo poucos ativos, o que levou a uma concessão de crédito descuidada”, afirma Kyra Fecteau, gestora de portfólio de renda fixa na Wellington Management.

De modo semelhante, Marc Rowan, da Apollo, disse recentemente ao FT que esses “acidentes de fim de ciclo” decorrem da corrida de dinheiro em busca de tomadores: “É o desejo de vencer em um mercado competitivo que às vezes leva a atalhos.”

Claro que a fraude pode ser sintoma de problemas maiores, ou até causá-los. Tomadores podem recorrer à fraude por estarem sob pressão econômica. E uma fraude suficientemente grande —algo na escala da Enron, por exemplo— poderia provocar uma correção nos mercados de ativos forte o bastante para arrastar a economia. Mas, até agora, há poucas evidências de um problema mais amplo. As taxas de inadimplência de empréstimos alavancados e títulos de alto rendimento vêm caindo, não subindo, segundo a Moody’s.

E, apesar dos incidentes recentes, as provisões e baixas contábeis nos balanços bancários do terceiro trimestre foram menores que as do segundo trimestre e menores do que os analistas esperavam. Após revelar o processo contra seu tomador, o Western Alliance confirmou que seus ativos “criticados” (em análise ou deteriorados) estão hoje em nível inferior ao do fim do segundo trimestre.

Fora de setores específicos, como o imobiliário, a economia parece sólida —se aceitarmos que a baixa criação de empregos decorre de fatores demográficos e de políticas migratórias. Sim, a economia de consumo é desigual e sustentada pelos mais ricos. Mas isso é uma velha história.

Na ausência de sinais mais claros de problemas sistêmicos ou de desaceleração econômica, nós não vamos gritar ao ver uma ou duas baratas. Mas continuamos vigilante.



Fonte ==> Folha SP

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