O primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney, 60, continuará à frente do país após o Partido Liberal derrotar a legenda conservadora de Pierre Poilievre, nesta segunda-feira (28), nas eleições nacionais, de acordo com projeções feitas pelas emissoras locais CTV News e CBC.
Poilievre reconheceu a derrota e prometeu trabalhar com os liberais para contrabalançar a guerra comercial de Trump. “Sempre colocaremos o Canadá em primeiro lugar”, afirmou a eleitores em Ottawa. “Os conservadores trabalharão com o primeiro-ministro e todos os partidos pelo objetivo comum de defender os interesses do Canadá e alcançar um novo acordo comercial que deixe as tarifas para trás.”
Com os votos ainda sendo contados, não estava claro, porém, se os liberais poderiam alcançar as 172 cadeiras necessárias para formar uma maioria parlamentar. A parcela de votos dos Liberais estava em 43,6% na manhã desta terça-feira (29), no horário de Brasília, com projeção de eleição de 154 assentos. Os conservadores, em segundo lugar, tinham 41,4% dos votos, o que lhes daria 131 cadeiras.
O atual premiê assumiu o cargo após vencer disputas internas de seu partido, cujo gatilho foi a renúncia, em janeiro, do então primeiro-ministro, Justin Trudeau, que permaneceu cerca de dez anos no posto e passava por longo período de desgaste.
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Foi Trudeau, no entanto, que pode ter dado o empurrão necessário para que Carney tivesse sucesso no pleito. Pouco antes de deixar a liderança do partido e o cargo nacional, ele fez um duro discurso em defesa do Canadá em meio à guerra de tarifas implementada pelo presidente americano, Donald Trump.
O discurso, amplamente visto como um dos melhores de Trudeau no cargo, catapultou as intenções de voto no Partido Liberal: até ali com pouco mais de 20% em pesquisas eleitorais, o menor nível em anos, a legenda saltou em poucas semanas para mais de 40%, ultrapassando o até então ascendente Partido Conservador, que por sua vez passou a cair.
Parte considerável da campanha de Carney, não por acaso, foi em tom de resistência às tarifas de Trump. A medida implementada pelo presidente americano atingiu o Canadá, um aliado histórico, como poucos países no mundo.
Antes do pleito, no entanto, esse posicionamento do liberal chegou a balançar, o que acabou dando força a Poilievre e adicionando dúvidas na reta final da disputa.
Após conversar com o presidente americano, no fim de março, Carney afirmou que Trump havia respeitado a soberania do Canadá durante a conversa. Uma reportagem da Radio-Canada, porém, revelou na semana anterior à eleição que o republicano repetiu na ligação o desejo de que o Canadá se torne um estado americano, detalhe omitido por Carney. A revelação estremeceu a imagem do primeiro-ministro como um líder forte que enfrentará o vizinho ao sul.
“Mark Carney foi pego em uma mentira”, disse Poilievre em um evento de campanha na semana passada, aproveitando a vulnerabilidade do adversário. “Se ele mentiu sobre isso, pode ter certeza que ele está mentindo sobre a inflação, o aumento de impostos e a crise habitacional. Não podemos confiar em nada do que ele diz.”
Mas a retórica não foi suficiente, e o Partido Liberal conquistou o quarto mandato consecutivo no país, segundo as projeções.
O recém-eleito primeiro-ministro afirmou nesta terça que seu país não deve “jamais esquecer as lições” da “traição” americana. “Venceremos esta guerra comercial”, declarou a uma multidão entusiasmada em Ottawa, onde advertiu sobre os dias “desafiadores” pela frente devido às tarifas e às ameaças de anexação de Trump. “Já superamos o choque da traição americana, mas nunca devemos esquecer as lições”, acrescentou.
Em comunicado divulgado nesta terça (29), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva parabenizou Carney e disse que o Brasil tem interesse em “avançar nas negociações de um acordo comercial entre o Mercosul e o Canadá”.
Carney diz que não fará alianças com o partido Bloc Québécois (BC), sigla formada por separatistas de Québec, a província de língua francesa no leste do país. O BC busca um referendo de independência como condição para sustentar qualquer governo no Parlamento.
Uma opção é o Novo Partido Democrático, de Jagmeet Singh, que por anos sustentou margem próxima de 20% dos votos e contribuiu com o governo de Trudeau. Recentemente, no entanto, houve um distanciamento entre as legendas em meio à crise liberal antes da renúncia do ex-premiê —e as intenções de voto no Novo Partido Democrático também caíram, para um nível próximo de 10%.
Carney tem mais de uma década de experiência à frente dos bancos centrais do Canadá e do Reino Unido —o canadense se tornou o primeiro não-britânico da história a conduzir a política monetária do país europeu quando trabalhou como governador do Banco da Inglaterra de 2013 a 2020, lidando com o brexit e com o início da pandemia de Covid-19.
Fonte ==> Folha SP