Carros precisam de troca de óleo para manter seus motores funcionando suavemente. Alguns influenciadores de antienvelhecimento, junto com um punhado de cientistas, dizem acreditar que trocar o plasma do seu sangue pode fazer algo semelhante para humanos, ajudando a retardar o envelhecimento biológico. O procedimento é atualmente oferecido por milhares de dólares por sessão em muitas clínicas de longevidade.
Em um carro, “você troca o óleo a cada 5.000 quilômetros porque isso limpa os detritos”, disse Eric Verdin, presidente e diretor-executivo do Buck Institute for Research on Aging. Seu sangue, ele disse, também pode acumular partículas potencialmente prejudiciais que podem ser eliminadas.
Um dos primeiros ensaios examinando a troca de plasma para antienvelhecimento em humanos, publicado na última terça-feira (27) na revista Aging Cell, oferece evidências iniciais de ele que pode ser capaz de retardar a deterioração biológica que vem com a idade, mesmo em pessoas saudáveis.
O estudo com 42 participantes, com idade média de 65 anos, descobriu que aqueles que receberam terapia de troca de plasma ao longo de alguns meses tinham concentrações mais baixas em seu sangue dos compostos biológicos que se acumulam com a idade, em comparação com um grupo de controle.
O ensaio foi patrocinado pela Circulate Health, uma startup de troca de plasma, e foi feito em coautoria de Verdin, cofundador da empresa e chefe do conselho consultivo científico.
Ainda assim, muitos outros cientistas que estudam a troca de plasma estão céticos. Seus benefícios antienvelhecimento para pessoas saudáveis “nunca foram comprovados” em grandes ensaios clínicos, disse Katayoun Fomani, professora associada e diretora médica do banco de sangue da Universidade do Alabama em Birmingham. Além disso, a retirada de sangue e substituição do plasma com fluidos adicionados poderia pôr os pacientes em risco de complicações médicas desnecessárias sem um benefício claro.
Como funciona o procedimento?
A troca de plasma é um tratamento bem estabelecido para certos distúrbios sanguíneos, doenças autoimunes e condições neurológicas, e geralmente é coberta pelo seguro saúde nos Estados Unidos quando considerada medicamente necessária. Não é coberta para fins de antienvelhecimento.
Durante a terapia, um provedor —tipicamente um enfermeiro registrado ou um técnico— conecta o paciente a uma máquina que retira o sangue. A máquina separa e descarta o plasma do sangue, substitui-o por plasma de doador ou um fluido substituto, e depois devolve o sangue ao paciente. O fluido substituto geralmente contém uma mistura de solução salina e proteínas, como albumina; em alguns casos, uma infusão de anticorpos ou medicamentos também pode ser adicionada para impulsionar o sistema imunológico ou combater certas doenças. Cada sessão normalmente leva algumas horas.
Hospitais e centros médicos usam a troca de plasma para remover partículas que aceleram a progressão de uma doença, como os anticorpos que atacam o sistema nervoso de um paciente na esclerose múltipla. Mas os defensores do procedimento para melhorar a duração e qualidade da vida dizem que ele pode ser usado como uma medida preventiva, para remover os anticorpos inflamatórios e proteínas que podem impulsionar o envelhecimento biológico (a deterioração de células e tecidos).
A terapia de plasma é um dos vários procedimentos experimentais de longevidade que envolvem transferências de sangue, incluindo o tratamento com plasma rico em plaquetas, que concentra e injeta o próprio sangue do paciente em áreas lesionadas; e um tratamento onde o sangue de um doador jovem é transfundido em um receptor mais velho.
A maior parte da pesquisa sobre os benefícios antienvelhecimento da troca de plasma foi feita em animais, portanto, as descobertas não se transferem necessariamente para humanos, disse Caroline Alquist, codiretora do Centro de Sangue Hoxworth da Universidade de Cincinnati.
Um estudo de 2020 em camundongos, por exemplo, descobriu que substituir parte do plasma sanguíneo dos animais por solução salina e albumina, uma proteína que se acredita ligar-se e ajudar a remover moléculas nocivas, parecia reverter marcadores biológicos do envelhecimento, especialmente nos tecidos cerebrais, hepáticos e musculares.
Até agora, a pesquisa em humanos tem se concentrado em pacientes que já têm uma doença relacionada à idade. Em um ensaio com quase 350 pacientes com Alzheimer, aqueles submetidos à terapia de plasma durante cerca de 14 meses apresentaram declínio cognitivo mais lento ou mais estável do que aqueles que receberam um tratamento placebo. Alguns estudos iniciais também sugerem que a terapia de plasma pode melhorar as taxas de sobrevivência para pessoas com doença hepática.
No ensaio da Circulate Health, um grupo de indivíduos recebeu uma infusão de albumina a cada poucas semanas; outro grupo recebeu a mesma infusão mais um anticorpo para combater infecções; e um grupo de controle recebeu apenas solução salina. Os pesquisadores usaram dezenas de testes de idade biológica para medir o sangue dos indivíduos várias vezes durante o regime completo de 3 a 6 meses.
Eles estimaram que o grupo de albumina e anticorpo diminuiu sua idade biológica em cerca de 2,6 anos, enquanto aqueles no regime de albumina viram uma redução de aproximadamente um ano. Pessoas que receberam apenas solução salina geralmente viram sua idade biológica aumentar ao longo do ensaio.
Quais são as questões em aberto?
Embora o estudo da Circulate Health seja “intrigante” e sugira que a troca de plasma parece afetar a composição sanguínea dos indivíduos mesmo após o procedimento, isso não significa necessariamente que ajudará as pessoas a viverem mais ou de forma mais saudável, disse Jeffrey Winters, presidente de medicina transfusional da Mayo Clinic. Ele disse que o ensaio era muito pequeno para provar benefícios antienvelhecimento; também não acompanhou os indivíduos por mais de alguns meses, então não está claro quanto tempo duram os efeitos da troca de plasma.
No estudo, os autores levantaram a hipótese de que os tratamentos poderiam se tornar menos eficazes ao longo do tempo à medida que o corpo se ajusta às infusões. (Os indivíduos tipicamente não mostraram muita diferença na idade biológica após a terceira medição, em comparação com o controle, sugerindo que o impacto da terapia poderia se estabilizar.)
Também não está claro se as descobertas são um resultado direto do tratamento ou se foram influenciadas por algum outro fator de confusão, como o perfil dos indivíduos, que eram pacientes saudáveis na área da Baía de São Francisco e recrutados pela Circulate Health, acrescentou Zbigniew M. Szczepiorkowski, professor de patologia e medicina laboratorial da Dartmouth Health.
Finalmente, embora a troca de plasma seja um procedimento médico relativamente seguro, ele traz riscos, disse Winters: a máquina pode falhar, danificando as células vermelhas do sangue e induzindo anemia no paciente, entre outros perigos. Embora as clínicas de longevidade usem principalmente solução salina e albumina, o plasma de doador também poderia transmitir uma infecção ao paciente.
“Especialmente dada a ausência de evidências na literatura”, disse Winters, o benefício do uso da troca de plasma para longevidade “realmente não existe”.
Fonte ==> Folha SP