Faculdades particulares de todo o país têm feito um saldão nas mensalidades para atrair novos alunos para cursos de graduação a distância que vão ser extintos pelo Ministério da Educação após a criação de novas regras para a modalidade.
As instituições de ensino têm oferecido descontos de mais de 60% nas mensalidades e gratuidade em algumas parcelas para estudar, por exemplo, em cursos de pedagogia e enfermagem a distância —graduações que passam a ser proibidas nessa modalidade.
Pelo decreto, publicado em 21 de maio pelo governo Lula (PT), as instituições de ensino têm até o fim de agosto para matricular novos alunos nos cursos que foram proibidos de serem oferecidos.
Ou seja, quem se matricular até essa data poderá fazer o curso a distância. Depois desse prazo, essas graduações entram em processo de extinção e não poderão aceitar novos alunos.
Um estudo feito pela consultoria Educa Insights aponta que as mensalidades de cursos a distância podem ter um aumento médio de até 21,6% depois das novas regras. Hoje, em média, esses cursos têm um custo de R$ 287 ao mês. O cálculo indica que, com as adaptações necessárias, eles devem passar a custar R$ 349 ao mês.
“Os grandes grupos têm condição de absorver esse aumento nos custos e reduzir a margem de lucro. Assim, evitam repassar o aumento para as mensalidades e perder aluno. As menores talvez não tenham essa mesma condição”, avalia Daniel Infante, sócio da consultoria.
Ele disse que o cálculo de aumento das mensalidades considera as condições das pequenas instituições de ensino. Não foi divulgado quais e quantas faculdades foram analisadas no levantamento.
Para ele, como o cenário futuro ainda é incerto, as instituições estão apostando em captar alunos até o fim do prazo para neutralizar um possível prejuízo nos próximos meses.
“O produto [curso] vai ter que mudar, elas vão precisar redistribuir a carga horária ou extinguir cursos, como o de enfermagem. Isso traz incerteza, por isso, muitas instituições estão criando esse senso de urgência, com descontos, para colocar muitos alunos para dentro nas próximas semanas”, diz.
O MEC disse que decidiu endurecer as normas para os cursos a distância por uma preocupação com a qualidade do ensino ofertado nessa modalidade. Com as novas regras, proibiu que cursos da área da saúde e licenciaturas sejam ofertados a distância e criou o modelo semipresencial —no qual metade da carga horária pode ser ministrada no EAD.
Os grupos educacionais avaliam que o aumento das exigências, tanto de carga horária presencial e quanto de maior infraestrutura pelos polos, vai elevar os custos.
Juliano Griebeler, presidente da Anup (Associação Nacional das Universidades Particulares), diz que cada instituição ou grupo educacional adota suas próprias estratégias de captação. Para ele, os grandes descontos anunciados estão dentro das regras já que a portaria do MEC autoriza a realização de novas matrículas até o fim de agosto.
“Elas têm essa janela para continuar matriculando alunos de forma mais previsível, ou seja, nos cursos com o formato que elas já conhecem, já sabem quais são os custos e procura. Há um receio de que as mudanças vão reduzir a entrada de novos alunos”, diz.
Para reduzir possíveis perdas, a estratégia das faculdades tem sido captar o maior número de novos alunos até o início da extinção dos antigos cursos. Assim, elas têm apostado em grandes descontos nas mensalidades. Um dos cursos que terá mudanças mais profundas é o de enfermagem, que só poderá ser ofertado na modalidade presencial.
Essa é a quarta graduação do país em número de matriculados, com 472,3 mil estudantes, sendo que 41% deles estudam em cursos a distância.
As faculdades têm oferecido grandes descontos em enfermagem. A Faculdade Estácio, por exemplo, anuncia a promoção como a “última chance de estudar enfermagem com maior flexibilidade”, com mensalidades de R$ 289 —metade do valor que era cobrado no início do ano.
Já a Faculdade Uninassau anuncia nas redes sociais uma “super promoção de desconto” para a “última oportunidade” de estudar enfermagem em EAD. As mensalidades caíram de R$ 553,47 para R$ 323,78.
A Uniasselvi e a Unicesumar, ambas da Vitru Educação (grupo educacional que concentra o maior número de alunos no país, com mais de 696 mil matriculados), também estão oferecendo mensalidades para o curso de enfermagem pela metade do preço.
A propaganda da Unicesumar diz “seu sonho de cursar a graduação EAD em enfermagem não pode esperar”. Oferece mensalidades de R$ 398,20. Antes, custavam R$ 737,41.
A Uniasselvi afirma que os interessados devem fazer a matrícula antes das alterações estabelecidas pelo MEC. Para o curso de enfermagem EAD no polo de Arapiraca, em Alagoas, por exemplo, as mensalidades caíram de R$ 675,80 para R$ 249 —um desconto de 63,2%.
Em nota, o MEC disse que as faculdades podem matricular novos alunos nos cursos a serem extintos até o fim do prazo desde que se limitem ao número de vagas anuais já autorizadas. “Após esse prazo, esses cursos EaD não receberão mais matrículas e novos estudantes só serão aceitos nos novos cursos semipresenciais ou presenciais, conforme o caso.”
Também destacou que os alunos matriculados nos cursos que entrarão em extinção devem ter assegurado o direito à conclusão da graduação no formato de oferta previsto no ato da matrícula, ou seja, no modelo anterior às novas regras.
Sobre a política de descontos, a Estácio informou que se trata de uma campanha que segue o mesmo “padrão de ações promocionais” da faculdade. “A política comercial e de precificação dos cursos atende a diversos critérios e variáveis, e o fato de estarmos na fase de transição regulatória não representa fator determinante nesse contexto.”
A Vitru Educação também negou que a promoção seja para captar novos alunos antes da mudança de regras e disse que as suas faculdades estão em um período de matrícula de alunos, “quando é natural que sejam adotadas estratégias comerciais de descontos e promoções.”
Questionadas, nenhuma das instituições respondeu se houve aumento na procura de novos alunos neste período antes da extinção dos cursos.
Principais mudanças:
Formatos de graduação:
- Presencial: Deve ter no máximo 30% da carga horária de atividades online. Antes, o limite era 40%
- Semipresencial: 30% da carga horária de atividades presenciais e 20% em atividades presenciais ou síncronas (aulas transmitidas ao vivo) mediadas.
- EAD: Regra exige que 10% da carga horária total seja com atividades presenciais e 10% em atividades presenciais ou síncronas mediadas.
Cursos que devem ser obrigatoriamente presenciais:
- Medicina
- Direito
- Odontologia
- Psicologia
- Enfermagem
Cursos que devem ser obrigatoriamente presenciais ou semipresenciais:
- Licenciaturas
- Demais cursos da área de saúde
Como devem ser a estrutura mínima dos polos EAD:
- Recepção
- Sala de coordenação.
- Salas ou ambientes para estudos individuais e coletivos, compatíveis com as atividades dos cursos ofertados e com o número de estudantes que deverão utilizá-las.
- Laboratórios e outros espaços formativos compatíveis com as atividades dos cursos ofertados.
- Equipamentos e dispositivos de acesso à internet e conexão de internet estável e de alta velocidade, compatível com o número de usuários. O polo deverá possuir espaços e infraestrutura física e tecnológica adequados às especificidades dos cursos ofertado.
Fonte ==> Folha SP