Falhas em aviões levaram à suspensão da Voepass – 29/05/2025 – Cotidiano

Falhas em aviões levaram à suspensão da Voepass - 29/05/2025 - Cotidiano

A suspensão cautelar dos voos da Voepass, determinada em 11 de março pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), está associada a uma série de falhas e problemas identificada em aviões da empresa durante inspeções.

Quando houve a interrupção das operações, a agência informou que a medida seria mantida até que a empresa comprovasse a correção de “não conformidades relacionadas aos sistemas de gestão previstos em regulamentos”.

Mas laudos de inspeções técnicas realizadas nas aeronaves, obtidos pela Folha, apontam cinco falhas estruturais, como deformação de fuselagem, danos na carenagem da porta de carga e trincas na junção entre a asa e a fuselagem. As cinco ocorrências foram identificadas em quatro aeronaves diferentes.

Questionada pela reportagem, a empresa disse que sempre cumpriu as exigências de segurança. “Em 30 anos de atuação, em um setor altamente regulado, a segurança dos passageiros e da tripulação sempre foi, e continuará sendo, a prioridade máxima da Voepass”, afirmou em nota.

A chamada “Operação Assistida”, que fez uma varredura nos equipamentos da empresa, teve início após o acidente aéreo de 9 de agosto de 2024, quando 62 pessoas morreram com a queda do turboélice no município de Vinhedo, interior de São Paulo.

A Anac afirma que, por meio das auditorias, “identificou um cenário de perda de confiabilidade dos mecanismos internos de detecção e correção de problemas da empresa”.

Os achados ocorreram em duas etapas. A primeira fase, realizada em agosto e setembro de 2024, e a segunda, em janeiro e fevereiro deste ano.

O trabalho se deu nas bases de manutenção da Voepass localizadas nos aeroportos de Ribeirão Preto, Guarulhos e Congonhas, em São Paulo, além de Recife (PE) e Galeão (RJ).

Conforme os laudos, no dia 27 de agosto, em Ribeirão Preto, foi detectado um primeiro problema: uma deformação (mossa) na fuselagem do lado direito de uma aeronave.

“O mecânico [da Voepass] responsável pela inspeção da aeronave não identificou o problema durante sua verificação inicial, tendo o dano sido percebido apenas após a intervenção da equipe de inspeção”, afirma o relatório.

Por protocolo, os aviões possuem um mapa de danos arquivado no sistema da empresa, que deve ser consultado sempre que um problema for identificado, para verificar se já está mapeado e sob controle. “Essa prática não foi observada durante a execução das tarefas de pernoite. Com isso, existe o risco de danos ocorridos durante a operação da aeronave permanecerem por tempo indeterminado sem mapeamento ou controle”, aponta a inspeção.

Em 11 de setembro de 2024, em Congonhas, foi identificada uma avaria na carenagem de proteção da porta de carga (flap door) de um avião. Duas semanas depois da notificação, a Voepass afirmou que tinha relatado o problema, mas a Anac verificou que a empresa usou “uma referência técnica incorreta, o que compromete a validade do procedimento adotado”.

O terceiro problema foi encontrado em 24 de setembro do ano passado, no aeroporto de Ribeirão. “Foram identificadas trincas na carenagem da junção asa/fuselagem, no lado esquerdo da aeronave”, afirma o relatório.

Após a inspeção da Anac, a equipe de manutenção providenciou a substituição da carenagem, mas um novo problema surgiu. “Foi constatado que o material de proteção contra descarga eletrostática estava danificado e que havia iniciado um processo de desfolhamento do material composto no bordo de ataque da carenagem”, aponta o relatório.

Em Recife, já em fevereiro de 2025, foi detectada uma quarta falha, com descolamento de uma fita localizada nas proximidades da carenagem da asa esquerda de uma aeronave. Essas fitas costumam ser usadas para selar junções ou superfícies móveis da asa.

A quinta ocorrência se deu no aeroporto de Guarulhos, em 11 de fevereiro de 2025. Foi constatado dano físico na fuselagem de uma aeronave, no local de encaixe do macaco hidráulico (jackpoint cover), local que é usado para serviços de manutenção, como troca de pneus ou inspeções do trem de pouso.

Em todos os casos, segundo a inspeção da Anac, não havia registro de qualquer ação corretiva que tivesse sido adiada, tampouco notificação sobre monitoramento daquele dano.

“A ausência de registro e monitoramento técnico de tais danos impossibilita a rastreabilidade de sua evolução, pode mascarar degradação estrutural progressiva e contraria os princípios do sistema de manutenção contínua”, diz documento obtido pela reportagem. “Diante dos fatos, ficou evidente a ineficácia do Sistema de Análise e Supervisão Continuada (SASC) da empresa.”

Em um período de apenas um ano e meio, entre agosto de 2023 e fevereiro de 2025, foram abertos 15 processos administrativos sancionadores pela Anac contra a Voepass.

O relatório conclui com a emissão de multas contra a empresa, além do pedido de suspensão de seu Certificado de Operador Aéreo, “em razão da gravidade dos fatos apurados, que comprometem a segurança operacional”. Tanto as multas quanto a suspensão foram confirmadas pela diretoria da agência.

Desde 11 de março, a Voepass segue sem operar em todo o país, mas ainda tenta resgatar seu certificado e voltar às atividades. No mês passado, a empresa entrou com pedido de recuperação judicial.

À Folha, a Voepass disse que “sempre atuou cumprindo com as exigências rigorosas que garantem a segurança das suas operações aéreas e reitera que sua frota sempre esteve aeronavegável e apta a realizar voos, seguindo exigências de padrões de segurança internacionais”.

Segundo a empresa, “todas as reposições de peças foram realizadas legalmente, sempre a partir de aeronaves com certificação de aeronavegabilidade e com rastreabilidade dos componentes” e essas ações “são documentadas e acompanhadas de perto pela agência reguladora”.

A Anac afirmou à reportagem que havia indícios de que o sistema de supervisão da companhia “havia se degradado desde o acidente, comprometendo sua capacidade de atuar preventivamente”.

Ainda segundo a agência, “a empresa deixou de oferecer garantias mínimas de que eventuais falhas seriam tratadas antes de comprometer a segurança das operações”.


As infrações

  • Data: 27/08/2024

    Avião: PR-PDW

    Local: Ribeirão Preto (SP)

    Falha: deformação (mossa) na fuselagem direita não detectada por mecânico da empresa

  • Data: 11/09/2024

    Avião: PS-VPA

    Local: Congonhas (SP)

    Falha: danos na carenagem da porta de carga; manutenção só registrada 13 dias depois, com base técnica inadequada

  • Data: 24/09/2024

    Avião: PR-PDW

    Local: Ribeirão Preto (SP)

    Falha: trincas na junção da asa e fuselagem; nova peça instalada apresentava danos

  • Data: 04 a 07/02/2025

    Avião: PR-PDT

    Local: Recife (PE)

    Falha: fita solta na asa esquerda sem registro ou controle

  • Data: 11/02/2025

    Avião: PP-PTQ

    Local: Guarulhos (SP)

    Falha: tampa de ponto de apoio danificada, com exposição de material composto



Fonte ==> Folha SP

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