A Prefeitura de São Paulo bateu o recorde deste século no empenho de dinheiro público para pavimentação e recapeamento de vias durante a gestão compartilhada entre Bruno Covas (PSDB) e Ricardo Nunes (MDB), segundo levantamento da Folha com dados abertos do orçamento municipal disponíveis desde 2003.
De 2021 a 2024, a administração destinou 15% dos seus investimentos para pavimento. Isso equivale a quase R$ 7 bilhões. São os maiores gastos proporcional e nominal, em valores corrigidos, para essa finalidade na comparação entre os cinco mandatos de quatro anos completos.
O segundo maior índice foi alcançado pela administração tucana de João Doria e Covas, com 10% de comprometimento de 2017 a 2020, R$ 1,7 bilhão em valores atualizados.
A proporção de recursos direcionados para o pavimentação na gestão Covas/Nunes se equipara, por exemplo, à soma empenhada para educação (9,9%), saúde (3,9%), assistência social (0,7%) e segurança pública (0,3%) no mandato.
A cifra analisada considera apenas investimentos, não inclui gastos obrigatórios, como salários e encargos, e outras despesas correntes de cada pasta.
Em nota, a gestão Nunes afirma que a Folha “prefere ignorar os relevantes investimentos em áreas como educação, saúde e segurança, entre outras, para induzir seu leitor a uma narrativa distorcida, leviana, que nem de longe condiz com a realidade”.
A prefeitura também disse que no período mencionado inaugurou sete hospitais e colocou outros 13 para funcionar 24 horas, entregou 46 escolas, zerou a fila para creches e aplicou R$ 2 bilhões na manutenção da rede. Destacou ainda ter conectado 40 mil câmeras e incorporado 280 viaturas, entre outros investimentos.
Foi sob Nunes, que assumiu o Executivo em maio de 2021 devido ao adoecimento e morte de Covas, que a prefeitura alcançou em 2023 a marca de 26% do investimento aplicado no piso de logradouros municipais, superando os 15% de 2020, maior verba orçamentária anual registrada até então. Reeleito em 2024, o prefeito reduziu o volume aplicado para 6% do orçamento em 2025, considerando dados até agosto.
O empenho proporcional com asfalto ainda supera as gestões do petista Fernando Haddad, que comprometeu 2%, de Gilberto Kassab (PSD), 5%, e do mandato iniciado por José Serra (PSDB) e concluído por Kassab, 3%. Só há dados disponíveis para os dois últimos anos do governo de Marta Suplicy (PT), cujo empenho médio no período ficou em 4%.
O crescimento dos gastos com pavimentação na administração Covas/Nunes ocorreu em um contexto de excepcional ganho de caixa devido à arrecadação de ISS (Imposto sobre Serviços) e à concessão para a União do aeroporto Campo de Marte em troca do abatimento de R$ 23,9 bilhões em dívidas da prefeitura com o governo federal.
É plausível considerar que gestores anteriores também gastariam mais com asfalto caso tivessem tamanha folga no orçamento, mas uma aplicação desproporcional nesta área está sempre mais alinhada ao retorno eleitoral do que ao social, segundo o pesquisador de administração pública Marco Antônio Carvalho Teixeira, da FGV Eaesp. “Em cidades carrocêntricas, essa é a mensagem: foco no motorista, não no coletivo”, diz.
Mesmo em um período de bonança, o aumento dos gastos no curto prazo representa risco para o futuro financeiro da cidade, diz Gustavo Fernandes, professor de finanças públicas da FGV. “Há políticas públicas mais relevantes quando pensamos a longo prazo do que gastar com pavimentação”, afirma.
Para Diogo Lemos, coordenador-executivo da Iniciativa Bloomberg para Segurança Viária Global, há ainda uma outra questão. O recapeamento de vias sem o acréscimo de obras de segurança viária não ataca a mais grave questão da mobilidade, as mortes no trânsito, afirma.
Segundo ele, a gestão Nunes não possui metas mensuráveis para obras voltadas a pedestres e à redução da velocidade dos veículos, como áreas calmas e alargamento de calçadas. “Vias só muito bem recapeadas fazem com que motoristas acelerem mais.”
Do ponto de quem usa automóvel, porém, a cidade efetivamente carecia de uma ampla renovação da cobertura das suas vias, diz Paulo Bacaltchuk, consultor e engenheiro de tráfego e transporte.
Além do desgaste, ele aponta os reparos feitos por concessionárias de serviços de água e gás como agravantes que justificam o recape. “Remendos causam acidentes, fora o custo de manutenção dos veículos”, diz.
Houve aumento das mortes no trânsito na capital de 2021 a 2024, que passaram de 577 para 860, segundo o Infosiga.
O tipo de pavimento também pode ser menos seguro, segundo o engenheiro João Merighi, professor do Instituto Federal de Tecnologia. Ele argumenta que o polímero asfáltico atualmente utilizado tem formado superfícies menos aderentes.
A prefeitura rebate dizendo utilizar o melhor material, considerando segurança viária, intensidade do tráfego e variações de temperatura. Atualmente, afirma a gestão, o recape conta com três tipos de textura, sendo que o mais utilizado na cidade é o SMA (Stone Matrix Asphalt), uma massa asfáltica que contém brita na sua composição. É um piso também aplicado em autódromos e rodovias justamente por proporcionar mais atrito com pneus.
Reparos de ruas e avenidas não ficaram restritos à verba reservada para investimento no último mandato. De 2021 a 2022, a operação tapa-buraco consumiu R$ 2 bilhões, em valores atualizados, da dotação orçamentária para o funcionamento da máquina.
Houve, no entanto, elevação de preços dos asfaltos da primeira vez em que Nunes esteve à frente da prefeitura. Derivados do petróleo foram impactados pela Guerra da Ucrânia. Após queda de 19% em 2021, ocorreram três altas anuais de 2022 a 2024: 34%, 11% e 10%, respectivamente.
Merighi ressalta, porém, que o asfalto representa em média 5% do peso da massa utilizada no pavimento. “Faz diferença no preço, claro, mas um aumento de 50% no asfalto não eleva o custo do pavimento na mesma proporção”, diz.
Informada sobre críticas de especialistas consultados, a prefeitura respondeu que, “por mais difícil que seja, a Folha precisa entender que a pavimentação de ruas e avenidas da cidade está dentro de uma política de segurança viária, com objetivo único e exclusivo de melhorar o deslocamento das pessoas, assim como evitar acidentes, inclusive para pessoas que se deslocam para as escolas, unidades de saúde, parques, e tantos outros importantes pontos da cidade”.
Prefeitura diz que Folha parece desconhecer realidade
A gestão do prefeito Ricardo Nunes criticou a reportagem da Folha. O texto abaixo é a versão integral da nota da prefeitura.
A “Folha de S. Paulo” prefere ignorar os relevantes investimentos em áreas como educação, saúde e segurança, entre outras, para induzir seu leitor a uma narrativa distorcida, leviana, que nem de longe condiz com a realidade.
O jornal parece desconhecer a realidade da cidade nos últimos anos, quando os investimentos para melhorar a mobilidade urbana ocorreram ao mesmo tempo em que esta administração inaugurou a 34ª UPA (contra 03 em 2016), inaugurou 7 hospitais públicos, colocou em funcionamento 24 horas 13 dos 17 Hospitais Dia. Resultado: a área de saúde do município se transformou exemplo.
Na Educação não foi diferente. A rede municipal zerou a fila para creches, 46 escolas foram entregues, além de ter sido investido mais de R$ 2 bilhões para que as unidades escolares tenham autonomia na manutenção e reparos, assim como compra de uniforme e material escolares.
Na área da segurança pública, a administração municipal implantou o maior sistema de monitoramento por câmeras da América Latina e que se tornou referência para outras cidades. O Smart Sampa tem hoje 40 mil câmeras conectadas. Também houve investimentos no efetivo da GCM, que desde 2021 ganhou o reforço de 2.000 agentes, chegando hoje a 7.500 no total.
Somente na atual gestão, 280 viaturas foram incorporadas à GCM, totalizando 610 veículos. A frota de motocicletas também aumentou de 14 em 2016 para 225 em 2024. Também foram colocadas câmeras em motos da corporação para tirar das ruas veículos com placas roubadas, furtadas ou adulteradas.
Por mais difícil que seja, a “Folha” precisa entender ainda que a pavimentação de ruas e avenidas da cidade está dentro de uma política de segurança viária, com objetivo único e exclusivo de melhorar o deslocamento das pessoas, assim como evitar acidentes, inclusive para pessoas que se deslocam para as escolas, unidades de saúde, parques, e tantos outros importantes pontos da cidade.
Fonte ==> Folha SP