Geração eólica e solar depende de leilão para usinas – 30/05/2025 – Mercado

A imagem mostra uma vista aérea de uma área de construção adjacente a uma floresta densa. À esquerda, há uma faixa de vegetação verde, enquanto à direita, várias estruturas em construção são visíveis, incluindo edifícios e áreas de terraplanagem. O solo é predominantemente marrom, indicando atividade de construção. No canto inferior esquerdo, pode-se ver um corpo d

O atraso na realização de um leilão que vai contratar termelétricas e hidrelétricas para suprimento de potência em horários de pico é uma má notícia para a expansão das fontes eólica e solar fotovoltaica, que têm sofrido nos últimos dois anos com cortes de geração, mesmo quando há recurso natural (vento e sol) à disposição.

Trata-se do LRCAP (leilão de reserva de capacidade na forma de potência), que foi cancelado no início de abril depois que participantes questionaram premissas do certame na Justiça. Na ocasião, o MME (Ministério de Minas e Energia) se comprometeu a reiniciar a disputa o quanto antes, para garantir sua realização ainda em 2025, mas até o momento não houve avanço.

O leilão vai contratar a disponibilidade de usinas hidrelétricas e térmicas, fontes despacháveis, ou seja, podem gerar energia assim que o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) solicita. A ideia é usar esta energia apenas quando for necessário, e as usinas devem receber uma remuneração para estarem disponíveis ao sistema sem garantia que irão efetivamente funcionar.

A flexibilidade é cada vez mais necessária no Brasil, enquanto cresce a geração eólica e solar, fontes intermitentes e, portanto, não despacháveis –como dependem do vento e da luz solar, a geração pode variar ao longo do dia e não há como garantir que irão produzir em um momento específico. Já as térmicas e hídricas oferecem maior segurança e podem começar a gerar quando o ONS solicita.

Por isso, quanto maior é a geração eólica e solar, cresce também a necessidade de geração despachável que garanta segurança ao sistema. Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), em 2024, a matriz elétrica brasileira expandiu 10,9 GW, dos quais 91% foram de fontes eólica e solar.

“O que o Brasil enfrenta hoje não é um problema de energia média, é de potência firme. Temos momentos com muita geração renovável e até vertimentos de água. Mas também temos momentos críticos, por exemplo, como no final da tarde, em que é preciso contar com recursos despachados e confiáveis”, explica o diretor de Estudos de Energia Elétrica da Empresa de Pesquisa Energética, Reinaldo da Cruz Garcia.

O crescimento da geração foi mais rápido que o avanço da infraestrutura de transmissão, o que contribui com o curtailment, termo para os cortes de geração determinados pelo ONS por razões como excesso de geração.

Como muitas das termelétricas disponíveis são inflexíveis, e têm prazos de acionamento mais longo, em alguns momentos o ONS precisa reduzir a geração de fontes mais baratas e sustentáveis, como eólica e solar, para priorizar as térmicas.

“Sem recursos flexíveis, o sistema precisa acionar térmicas por muitas horas, já usinas com boa flexibilidade e resposta rápida permitem que o sistema acomode melhor o acréscimo de eólicas e solares, que são usinas intermitentes, variáveis”, explica Garcia. “Essa é a lógica moderna da operação: em vez de manter térmicas ligadas por muitas horas, o ideal é que elas entrem de forma pontual, apenas quando o sistema realmente necessitar”, complementa.

Segundo dados da Aneel, dos 210 GW em operação no país, 33,4 GW, ou 15,9%, são da fonte eólica, e outros 17,7 GW, ou 8,41%, são da fonte solar fotovoltaica. A solar tem ainda outros 39 GW instalados em geração distribuída, categoria em que se enquadram pequenos empreendimentos e telhados solares das residências.

“As usinas térmicas e hídricas com mais flexibilidade ajudam a destravar mais a utilização de renováveis e o sistema pode se tornar mais eficiente”, resume Garcia.

Atributos das fontes flexíveis

Cada fonte, entretanto, tem suas particularidades. As térmicas são mais poluentes e caras, e normalmente demandam algumas horas até que as máquinas comecem a gerar energia. Já as hídricas apresentam mais riscos em momentos de menos chuvas.

” Na prática, são as térmicas que garantem que as renováveis possam crescer de forma segura, sem comprometer a continuidade do fornecimento”, diz Xisto Vieira, presidente da Abraget (Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas).

A presidente da Abrage (Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica), Marisete Pereira, destaca que as hidrelétricas podem ajustar a geração “quase que instantaneamente, garantindo estabilidade, continuidade no fornecimento”.

Segundo ela, os períodos de menos chuvas, que comprometem os reservatórios das hidrelétricas, podem ser administrados graças à interligação do Sistema Interligado Nacional –um período de escassez no Norte vem geralmente com boas chuvas no Sul, por exemplo, e a energia pode circular pelo país por meio das linhas de transmissão que conectam uma região à outra.

Atendimento ao pico da demanda

Durante o horário de pico de demanda no Brasil, entre 15h e 22h, e o maior desafio é no fim do dia, quando o sol se põe. “O Brasil vem tendo rampas de cargas [aumento intenso e contínuo da demanda] mais inclinadas, especialmente no final da tarde. Sem recursos flexíveis, o sistema precisa acionar térmicas por muitas horas”, explica Garcia, que também menciona outras formas de flexibilidade, como baterias e resposta da demanda, que não entraram nas últimas diretrizes do LRCAP.

A chamada “rampa da solar” está cada vez maior, devido ao crescimento da capacidade instalada da fonte.

“Hoje, sobra energia e está faltando potência, em um desenquadramento que aumenta assustadoramente com o passar dos anos. A carga cresce 3 GW na ponta a cada ano”, disse o diretor de Operações do ONS, Alexandre Zucarato, durante o evento Fórum Brasileiro de Líderes em Energia, no Rio de Janeiro. Para ele, seria necessária a realização de um leilão por ano com contratação de 3 GW em potência para o atendimento à ponta da carga.

Estudos mais recentes do ONS já acendem um alerta. A edição do Plano da Operação Energética 2024-2028 indica violações em critérios operativos de potência a partir de outubro de 2025. A Empresa de Pesquisa Energética prevê déficit de potência a partir de outubro de 2027, com necessidade de 5,5 GW adicionais em potência em 2028.

Segundo Marisete, da Abrage, as usinas hidrelétricas já poderiam colaborar com pelo menos 5 GW de potência a partir de 2029, por meio de motorização de poços vazios em usinas existentes, com infraestruturas já prontas. Ela diz que as usinas já têm toda a documentação pronta para esta expansão.

“A grande maioria das hidrelétricas já tem pré-contratos firmados com fornecedores, de modo que elas podem, sim, fazer a entrega dessa potência ainda em 2029, ou até antecipar”, afirma.

Prazo apertado para 2025

Após o cancelamento do LRCAP, o MME declarou que um novo certame aconteceria ainda em 2025, para evitar o risco de déficit de potência. Com o atraso da abertura de uma consulta pública, os prazos ficam cada vez mais apertados, e um blecaute este ano será evitado apenas porque há usinas antigas e descontratadas disponíveis para a operação, ainda que com custo mais elevado.

Zucarato, do ONS, acredita que o operador poderá acelerar os prazos de análise sobre as margens de escoamento –ou seja, quanto há disponível nos sistemas de transmissão em cada região do país. “É uma atividade bastante extensa que normalmente dura 85 dias. Mas vamos aproveitar ao máximo todo o cálculo de margem que foi feito para conseguir reduzir, talvez para um mês. Se as premissas não mudarem muito, a gente consegue reaproveitar o trabalho que já foi feito e ganhar esse calibre”, disse.

Garcia, da EPE, também avalia que a avaliação técnica e dos projetos deve ser mais célere. “Claro que vai depender do novo cronograma que o MME definir, mas não estamos na inércia. Certamente a avaliação dos projetos cadastrados será mais rápida”, avalia.



Fonte ==> Folha SP

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