A falta de exame pericial no corpo de Juliana Marins no local em que foi encontrado e as condições de temperatura e umidade na região podem dificultar a definição da data e do horário da morte da brasileira que caiu no penhasco do vulcão Rinjani, o segundo mais alto da Indonésia, quando fazia uma trilha.
Especialistas em medicina legal, ouvidos pela Folha, avaliam que uma série de elementos importantes comumente usados em autópsia para determinar o horário de morte não puderam ser analisados por conta da condições em que o corpo da jovem foi encontrado no monte.
“A baixa temperatura, o excesso de umidade no local interferem nas análise do tempo de morte. A ausência de um exame perinecroscópico também dificulta essa precisão”, diz Marcos Camargo, presidente da APCF (Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais).
O exame perinecroscópico é uma análise forense realizada no local em que o corpo é encontrado, no qual são coletadas informações a respeito das condições externas do cadáver. É diferente do exame de necropsia, que é feito por um médico legista no Instituto de Medicina Legal.
O objetivo principal é documentar e analisar as características do corpo e as lesões externas, auxiliando na reconstrução da cena do crime e na compreensão da dinâmica da morte.
“Não é uma crítica ao trabalho que foi feito pelos profissionais da Indonésia, até porque não havia uma equipe que pudesse fazer isso naquele local. Mas, sem esse exame, não é possível identificar informações importantes que ajudam a definir o horário de morte.”
Para os especialistas, as lesões encontradas pela autópsia são compatíveis com a análise de uma morte rápida. Eles, no entanto, dizem ser necessário mais informações para identificar se a estimativa de 20 minutos é precisa.
Segundo a autópsia divulgada nesta sexta-feira (27) por autoridades da Indonésia, Juliana teria sofrido um trauma contundente que resultou em danos a órgãos internos e hemorragia. O médico responsável pelo exame afirmou não haver evidências que sugerissem que a morte ocorreu muito tempo após os ferimentos.
A partir dos resultados da autópsia, ele estimou que a morte de Juliana ocorreu em torno de 20 minutos após ela sofrer os ferimentos.
“É muito difícil associar o tempo de morte apenas com informações genéricas sobre as lesões encontradas. É preciso identificar quais foram os tipos das lesões, a profundidade e extensão para uma estimativa mais precisa”, diz Luiz Carlos Prestes, médico legista.
Para ele, ainda é fundamental esclarecer quando as lesões, que resultaram na morte de Juliana, teriam ocorrido. “O que ainda está muito vago e parece que não foi concluído pela autópsia é quando esse trauma, que levou à morte, ocorreu. Isso é importante e não está esclarecido”, diz.
Responsável pela autópsia de Juliana, o especialista forense Ida Bagus Alit disse à BBC News Indonésia que a morte da jovem teria sido na quarta-feira, 25 de junho, entre 1h e 13h no horário local —entre 14h de terça (24) e 2h de quarta, no horário de Brasília.
Contudo, essa estimativa da hora da morte de Juliana coloca em xeque o que havia sido divulgado pela Basarnas, a agência responsável pelas buscas e resgates da Indonésia, de que a publicitária brasileira foi encontrada na noite de terça-feira (24), já sem vida.
“De fato, é diferente da declaração de Basarnas. Há uma diferença de cerca de seis horas em relação ao horário declarado por Basarnas. Isso se baseia nos dados de cálculo do médico”, explicou Alit à jornalista Christine Nababan, da BBC News Indonésia.
Para o médico Syro Maiuri, que trabalhou como legista e é especialista em medicina legal, ainda que as condições ambientais possam atrapalhar a precisão do tempo de morte, as lesões identificadas na autópsia são compatíveis com uma morte rápida.
“É possível que a estimativa não esteja tão precisa, mas as informações da lesão indicam para uma morte que teria ocorrido em poucos minutos. Pode ser que tenham ocorrido, 20, 30 ou até 60 minutos após o trauma. Mas são lesões que não permitiriam a sobrevivência por muito tempo.”
À imprensa, Alit disse que foram encontradas fraturas no tórax, ombro, coluna e coxa. Essas lesões teriam causado danos a órgãos internos e sangramento. Ele também afirmou que não havia evidências que sugerissem que a morte tivesse ocorrido muito tempo após os ferimentos.
“Por exemplo, havia um ferimento na cabeça, mas nenhum sinal de hérnia cerebral. A hérnia cerebral geralmente ocorre de várias horas a vários dias após o trauma. Da mesma forma, no tórax e no abdômen, houve sangramento significativo, mas nenhum órgão apresentou sinais de retração que indicassem sangramento lento”, explicou.
O especialista também destacou que é difícil determinar a hora exata da morte. “É importante lembrar que fatores ambientais, como temperatura e umidade, afetam as alterações post-mortem. Pode haver diferenças.”
Disse também que o tempo para a transferência do corpo —que foi levado da Ilha de Lombok, onde se localiza o Monte Rinjani, para Bali dentro de um freezer por várias horas— pode prejudicar ainda mais a definição do horário exata da morte.
Fonte ==> Folha SP