O Ministério de Minas e Energia voltou a pressionar a pasta do Meio Ambiente para tentar ampliar a exploração de petróleo na bacia Potiguar, que compõe a chamada margem equatorial.
O novo capítulo da disputa entre Alexandre Silveira e Marina Silva acontece em um momento no qual o governo Lula (PT) aposta nos combustíveis fósseis para tentar ampliar sua arrecadação em meio à crise com o Congresso.
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Documento obtido pela Folha mostra que o Ministério de Minas e Energia insiste para que o do Meio Ambiente renove a autorização para leiloar 14 blocos de petróleo da bacia Potiguar, que fica na costa do Rio Grande do Norte, próximo a Fernando de Noronha, um dos principais pontos turísticos do Brasil e conhecido por suas belezas naturais.
Essa documentação foi elaborada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) e venceu em 17 de fevereiro deste ano. Pelas regras do setor, a ANP só pode oferecer um bloco se tiver, antes, uma “manifestação conjunta” das duas pastas que permita isso.
Tal autorização é obrigatória mas não substitui a licença ambiental, etapa que o empreendedor tem de buscar após vencer o leilão de determinado bloco.
Hoje, o maior foco de preocupação sobre este tema é a bacia Potiguar. Esta é pelo menos a terceira vez, desde o final de 2024, que o MME (Ministério de Minas e Energia) tenta renovar a autorização para leiloar estes 14 blocos —nenhuma delas com sucesso até aqui.
No fim de maio deste ano, o Ministério de Minas e Energia cobrou um “alinhamento necessário” com o Meio Ambiente sobre o tema.
“Ressaltamos que, com o objetivo de promover a construção de um entendimento comum, este MME já formalizou convite para participação do MMA [Ministério do Meio Ambiente] nas reuniões de alinhamento sobre a manifestação conjunta com a ANP, entretanto, até a presente data, não obtivemos retorno”, diz a pasta de Minas e Energia.
“Reiteramos, assim, a solicitação de indicação de representante técnico por parte do MMA para participação nos referidos encontros”.
À Folha, porém, o Ministério de Meio Ambiente nega que esteja protelando discussões sobre o tema.
“Não procede a afirmação de que o MMA não tem respondido aos pedidos”, diz a pasta, em nota. “Desde o início deste governo, em 2023, até a presente data (4 de junho de 2025), foram analisados pelo Grupo de Trabalho Interinstitucional sobre Atividades de Exploração e Produção de Óleo e Gás do MMA (GTPEG) 14 solicitações de avaliação ambiental prévia, encaminhadas pelo MME e ANP.”
Essas análises, segundo o ministério, resultaram na assinatura de 11 manifestações conjuntas. Até o momento, o grupo já avaliou um total de 611 blocos, dos quais 119 não foram considerados ambientalmente aptos ou foram encaminhados para estudos ou ajustes.
“Para o restante dos 492 blocos, que se encontram em áreas de exploração consolidadas, não foram observadas restrições ambientais nesse momento, podendo seguir para o licenciamento ambiental, caso arrematados nos leilões”, declarou o ministério chefiado por Marina Silva.
O Ministério de Minas e Energia foi questionado pela reportagem sobre o assunto, mas não respondeu.
A insistência do ministério em renovar essas autorizações não é casual. Por trás dessa decisão estão dezenas de outros blocos que terão o mesmo destino em breve e que podem necessitar do mesmo tipo de ação por parte dos dois ministérios.
A margem equatorial é composta pela porção marítima de cinco bacias: Barreirinhas, Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Potiguar e Ceará.
Na próxima terça-feira (17), o governo realiza um leilão que inclui 47 blocos da Foz e mais 17 da Potiguar —dentre outros.
No dia seguinte, porém, na quarta (18), acaba a validade da manifestação conjunta para estes e outros blocos em toda a costa brasileira (145 no total). Se eles não forem arrematados neste momento, dependerão de uma nova autorização para ir a leilão novamente.
Como mostrou a Folha, este prazo pressiona o ministro Alexandre Silveira para que o leilão seja um sucesso, uma vez que o governo Lula espera que o dinheiro arrecadado com essas ofertas ajude a equilibrar as contas da União.
Silveira solicitou a Marina a renovação destes blocos pela primeira vez no final de 2024.
Em janeiro, como revelou a Folha, o Meio Ambiente negou, sob argumento de que a revisão dos estudos sobre a área (feitos nos anos 2000) encontrou novos riscos, e apontou que a área é de sensibilidade maior do que a estimada inicialmente.
Os técnicos relatam que eles têm, por exemplo, sobreposição com cinco áreas prioritárias para conservação, incluindo algumas de importância biológica extremamente alta.
Por isso, a pasta ambiental pediu inclusive que não só os 14 blocos que já perderam a autorização, mas também os 17 que ainda possuem manifestação válida, fossem excluídos do rol de ofertas da ANP.
O Ministério de Minas e Energia negou e disse que todos os blocos da bacia Potiguar têm respaldo de pareceres de ICMBio (Instituto Chico Mendes de Biodiversidade) e Ibama, de 2018 e 2019, além de estarem em uma região onde a própria Petrobras já explora petróleo, sem registro de objeções ambientais.
A pasta de Silveira recorreu em fevereiro, mas novamente sem sucesso. A avaliação da equipe de Marina Silva é que a região carece de estudos mais amplos e estruturais sobre suas características e riscos e, enquanto isso não for feito, a atividade não deve ser ampliada.
Uma manifestação conjunta costuma demorar até três meses para ser elaborada pelas duas pastas. A renovação pode ser ainda mais rápida.
Caso blocos da bacia Potiguar não sejam arrematados no leilão da próxima terça (e, portanto, fiquem sem a manifestação), integrantes do setor avaliam que, mesmo no melhor dos cenários, a ANP só conseguiria oferecê-los novamente após alguns meses.
Isso deve aumentar ainda mais a pressão sobre Silveira, pela proximidade do período eleitoral a urgência cada vez maior do governo mostrar resultados econômicos.
Fonte ==> Folha SP