A China está reduzindo suas emissões de carbono em relação a 2024, segundo relatório elaborado por Lauri Myllyvirta, do Centro de Pesquisa sobre Energia e Ar Limpo, para o portal de informações sobre o clima Carbon Brief.
Ele concluiu que as emissões totais de dióxido de carbono pela China, no primeiro trimestre de 2025, caíram 1,6% em relação ao mesmo período do ano passado.
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Outros especialistas que conversaram com a BBC afirmam não terem confirmado os números do relatório de forma independente. Mas eles observam que as mudanças das fontes de energia empregadas pela China indicam que o país está a ponto de pôr fim às décadas de aumento das suas emissões de carbono —se é que já não atingiu este objetivo.
As emissões chinesas já caíram anteriormente, mas apenas em épocas de crise, como a pandemia de Covid-19, que freou a economia do país.
Se os números forem confirmados, esta será a primeira queda das emissões da China durante um período de crescimento da demanda de energia, necessário para atender às suas atividades econômicas.
“O governo [chinês] observa cada vez mais a energia do carvão ocupando papel secundário”, segundo ela.
Yang afirma que não verificou os dados detalhados de Myllyvirta, mas concorda que as emissões de carbono da China para produção de energia estão deixando de crescer. Isso se deve particularmente ao aumento da participação da eletricidade renovável no seu mix de produção.
Pico ou estabilidade?
Mas o fato de que a China está tomando as rédeas do crescimento das suas emissões não garante que virá a seguir uma queda de forma estável.
“Você pode ter um pico muito cedo, mas atingir a estabilidade naquele nível por um longo período, o que não é muito útil para as ações climáticas”, explica Li Shuo, do Instituto de Políticas da Asia Society (ASPI, na sigla em inglês).
O que virá depois do pico depende de toda uma série de fatores, domésticos e globais.
Para Li, a instabilidade atual do mercado global de petróleo —causada por eventos como a guerra na Ucrânia— acelerou a determinação dos líderes chineses de garantir o fornecimento de energia do país nos últimos anos.
Para isso, eles recorreram ao carvão, abundante na China.
“Se observamos aumento das turbulências geopolíticas, acho que a busca pela segurança energética estará ali, o que representará um grande problema para a transição climática da China”, afirma Li.
Mas o diretor do Instituto Griffith Asia na Austrália, Christoph Nedopil Wang, afirma que a busca da segurança energética resolve os dois problemas.
Ele destaca que, ao lado das suas reservas de carvão, a China detém uma posição dominante global em tecnologias de energia limpa, incluindo turbinas eólicas e painéis solares.
Para Wang, “qualquer redução das importações decorrente do aumento da parcela da energia renovável aumenta a segurança nacional da China”.
Wang não acredita que as tensões comerciais com os Estados Unidos e a redução do crescimento econômico levem os líderes chineses a estimular formas de crescimento que possam causar uma nova escalada das emissões de carbono.
Os estrategistas chineses acreditam que os futuros motores da economia serão setores com emissões relativamente baixas, como TI, biotecnologia, veículos elétricos e tecnologias de energia limpa. E Wang prevê que a China, muito provavelmente, irá tentar desenvolver estes setores.
“Estas indústrias realmente mudaram o centro de gravidade da economia chinesa, afastando-se de alguns dos setores responsáveis por maiores emissões”, explica ele. “Não vejo a China disposta a expandir massivamente aquelas indústrias antigas, como a siderurgia.”
É preciso que a ambição climática seja permanente
Todos os especialistas mencionados nesta reportagem afirmam que a China reduziu sensivelmente o crescimento das suas emissões de carbono, independentemente de já ter ou não revertido o processo.
Mas o país ainda enfrenta sérias dificuldades para cumprir seus compromissos internacionais sobre as emissões de carbono.
Segundo as disposições do Acordo de Paris, a China se comprometeu a reduzir sua intensidade de carbono em mais de 65%, em relação aos níveis de 2025. O prazo para esta redução é de 2030.
A intensidade de carbono mede as emissões geradas por unidade de produção econômica.
Durante a pandemia de Covid-19, a China saiu totalmente dos trilhos em relação a esta promessa. Isso se deveu à sua dependência de indústrias com uso intensivo de energia naquele período.
O eventual fracasso do maior emissor do mundo no cumprimento do seu principal compromisso climático internacional seria um forte golpe para as ações climáticas multilaterais.
Agora, a única esperança chinesa de atingir este objetivo é fazer com que suas emissões de carbono caiam a partir de agora até 2030, segundo Lauri Myllyvirta. E a redução das emissões identificada por ele é um começo, embora precise ser seguida por uma política ambiciosa e objetivos definidos.
Nos próximos meses, as ações da China sobre o clima estarão na mira do público.
A cúpula climática COP30 está programada para novembro, em Belém (PA). E, nos meses que antecederão a conferência, a China irá anunciar seus objetivos atualizados em relação ao Acordo de Paris.
Em meio à hostilidade do governo americano de Donald Trump em relação às ações climáticas multilaterais, a China vem tentando se posicionar como líder global sobre a questão.
Em uma conferência climática em abril, o presidente chinês Xi Jinping declarou aos líderes mundiais que, “em vez de falar e falar, precisamos percorrer o caminho… precisamos transformar nossos objetivos em resultados tangíveis”.
Por isso, é provável que a China queira evitar parecer que estaria abandonando seus objetivos de intensidade climática, que formam o principal compromisso climático internacional do país.
Seus líderes talvez observem a possível redução das suas emissões, iniciada no ano passado, como uma conquista que vale a pena ser defendida.
Li Shuo, do ASPI, explica que os líderes chineses irão definir seus novos objetivos climáticos de olho na opinião pública.
“Eles irão ponderar um conjunto complexo de fatores —incluindo, é claro, suas próprias ambições, mas também a geopolítica e como a China será vista pelo resto do mundo”, conclui ele.
Este texto foi publicado originalmente aqui.
Fonte ==> Folha SP