PIB: economista da FGV avalia cenário para 2025 – 30/05/2025 – Mercado

A imagem mostra a economista Juliana Trece, uma mulher sorridente com cabelos longos e lisos. Ela está vestindo um blazer preto sobre uma blusa estampada.

Após registrar crescimento de 1,4% com a recuperação da agropecuária no primeiro trimestre, o PIB (Produto Interno Bruto) tende a desacelerar ao longo de 2025 no país, aponta a economista Juliana Trece, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

A previsão de ritmo menor está associada ao fim do impulso da safra e à persistência dos juros altos para levar a inflação de volta para a meta perseguida pelo BC (Banco Central).

Em meio a esse cenário e sob efeito de um quadro fiscal “bastante delicado”, o governo Lula (PT) não teria espaço para adotar novas medidas de estímulo à economia, segundo Juliana. A pesquisadora, contudo, não descarta que isso aconteça.

“Acredito que não [teria brecha], mas também não duvido. Acho que esse espaço está ficando cada vez mais reduzido”, afirma a economista, que coordena a pesquisa do Monitor do PIB do FGV Ibre.

“O governo tem um quadro fiscal bastante delicado e tem tentado aumentar as receitas para não ter tanto comprometimento no gasto. Mas, por exemplo, não se sabe se a medida [de aumento] do IOF vai passar ou não”, acrescenta.

No primeiro trimestre de 2025, o aumento do PIB foi puxado pelo salto de 12,2% na agropecuária, de acordo com os dados divulgados nesta sexta-feira (30) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

O impulso vindo da safra já era aguardado, diz Juliana, que destaca o desempenho “relevante” de outros componentes mesmo com os juros altos.

Nesse sentido, ela cita as taxas positivas do setor de serviços (0,3%), do consumo das famílias (1%) e dos investimentos produtivos (3,1%).

Por ora, o FGV Ibre projeta crescimento de 1,9% para o PIB no acumulado de 2025, abaixo dos 3,4% do ano passado.

Qual é a sua avaliação geral sobre os dados do PIB do primeiro trimestre?

O grande destaque, obviamente, foi a agropecuária. Mas é importante destacar que o setor de serviços também teve um desempenho relevante, o crescimento de 0,3% em um contexto de aperto monetário. E ainda mais relevante talvez seja o desempenho do consumo das famílias e da Formação Bruta de Capital Fixo [indicador de investimentos].

Na verdade, os componentes da demanda, de modo geral, vieram com resultados muito bons, positivos, apesar de todo o contexto que a gente tem. Foi o que surpreendeu. O número como um todo, sendo puxado pela agropecuária, não é uma surpresa.

Mesmo que a agropecuária tenha sido a grande responsável, esse crescimento tem também um pouco de um papel disseminado de alguns setores. Apenas a indústria teve retração [-0,1%]. Foi, inclusive, uma retração mínima. A gente considera uma estabilidade.

O efeito direto da safra no PIB é mais concentrado no início do ano, e os juros seguem altos no país. O que espera a economia nos próximos trimestres?

A expectativa é de uma desaceleração da economia daqui para frente. Não significa que ela vai retrair. Significa apenas que essa magnitude de crescimento, de 1,4%, não vai ser observada. Não tem nenhuma evidência que mostre isso se repetindo.

A agropecuária acabou ajudando, mas a gente já vê alguns efeitos de um ambiente mais restritivo com os juros elevados. Por exemplo, dentro da indústria, a transformação e a construção mostraram quedas no primeiro trimestre. São atividades que, em geral, são mais afetadas quando há aumento de juros.

A expectativa é que isso permaneça ao longo do ano, com maiores desafios até para mantermos o nível da Formação Bruta de Capital Fixo, que cresceu 3,1% no primeiro trimestre. É algo que não deve acontecer ao longo dos próximos trimestres, dado todo o contexto que a gente tem no país.

Quando a gente pensa no consumo das famílias, ele também deve desacelerar. Agora, se vai ser muito ou pouco, é algo mais incerto. Quando há estímulos governamentais, esse é um componente que normalmente sente o efeito direto. Transferências de renda acabam afetando muito o desempenho do consumo das famílias.

Então, caso o governo adote medidas nesse sentido, vai ajudar esse componente, embora a desaceleração deva acontecer. Pode desacelerar menos [com a eventual atuação do governo].

Com a inflação acima da meta e os juros altos para contê-la, há espaço para novos estímulos à economia ao longo deste ano?

Acredito que não, mas também não duvido. Acho que esse espaço está ficando cada vez mais reduzido. O governo tem um quadro fiscal bastante delicado e tem tentado aumentar as receitas para não ter tanto comprometimento no gasto.

Mas, por exemplo, não se sabe se a medida [de aumento] do IOF vai passar ou não. Tem muito ruído por trás dela, muita insatisfação com essa medida. Então, ela pode ser derrubada.

Toda a tentativa do governo de fazer um ajuste fiscal via aumento das receitas não está sendo muito bem vista. É muito pouco provável que ele tenha espaço para aumentar também o gasto, fazendo qualquer ação no sentido de aumentar o consumo das famílias. Mas não tem como a gente saber, né?

Pode ser que, ao longo do ano, alguma medida seja implementada. Mas o espaço está ficando cada vez menor por todo esse contexto fiscal bastante delicado.

Dentro do PIB, qual pode ser o impacto para a agropecuária e a indústria dos embargos comerciais gerados pelo foco de gripe aviária no RS?

O impacto pode ser negativo, mas a gente teve um crescimento das exportações no primeiro trimestre muito associado a produtos agropecuários. A gente já exportou muita soja.

Como a agropecuária está muito influenciada pela questão da lavoura, ele [efeito da gripe aviária] talvez seja atenuado. Acho que vai ser mais pontual do que qualquer outra coisa.

Como avalia o cenário para a política monetária no país? Tende a seguir restritivo, com os juros altos, ou há espaço para algum alívio até o fim do ano?

É um ambiente de muita incerteza. Até o final do ano, pode ser que tenha algum alívio, mas vai depender muito de como vão ser as ações. Por exemplo, a própria questão do IOF, se vai passar ou não.

O IOF acaba tendo um efeito recessivo na economia, encarece o crédito, encarece várias medidas. Assim, talvez a gente não precise ter o Banco Central aumentando tanto a taxa de juros. Vai depender se isso vai passar, qual vai ser o efeito.

O cenário também vai depender de como estará o contexto externo de incerteza. Qualquer movimento externo de aumento de incerteza pode se refletir na saída de recursos do país para economias mais fortes.

O IBGE associou a alta do consumo das famílias, mesmo com os juros elevados, a fatores como o mercado de trabalho. Qual é a sua avaliação sobre esse ponto?

Há impacto do mercado de trabalho, com aumento do rendimento e da massa salarial, além do auxílio governamental. É uma junção de fatores, mas o principal é o mercado de trabalho aquecido.

A gente tem observado uma redução da taxa de desemprego, que acaba gerando maior disponibilidade de renda para as famílias consumirem.

Também comentaria sobre o quão parecido esse resultado do PIB [do primeiro trimestre] é com o de 2023, quando a gente também estava em um pico de aperto monetário.

Naquele período, a agropecuária conseguiu, pela ótica da produção, segurar um pouco a economia. Pela ótica da demanda, foi a exportação, inclusive porque a gente exporta muitos produtos agropecuários.

Devemos ter uma dinâmica parecida em termos de desaceleração ao longo do ano. Mas agora o contexto externo é muito mais desafiador do que em 2023. A gente não tinha o fator Trump e a guerra comercial e agora tem.


RAIO-X | JULIANA TRECE, 35

Atua como economista do FGV Ibre e coordenadora da pesquisa do Monitor do PIB da mesma instituição. É doutora em população, território e estatísticas públicas e mestre em economia empresarial.



Fonte ==> Folha SP

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