O uso indevido dos meios de comunicação pode fazer com que os tribunais superiores mantenham a cassação do vereador de São Paulo Rubinho Nunes (União) na opinião de dois especialistas em direito eleitoral consultados pela Folha.
Eles se baseiam em precedentes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), principalmente a cassação do mandato de deputado estadual no Paraná de Fernando Francischini (do então PSL, que hoje faz parte do União), em 2021. Mas essa opinião não é unanimidade, e outras pessoas apontam que a punição pode ser muito pesada.
Aliado do candidato a prefeito Pablo Marçal (PRTB), derrotado no primeiro turno, Rubinho republicou às vésperas da eleição de 2024 uma postagem do coach com um suposto laudo de que Guilherme Boulos (PSOL) teria sido internado por overdose de drogas. O documento era falso e o médico que teria assinado, inclusive, já estava morto na época, além de nunca ter trabalhado na clínica mencionada.
No último dia 30, a Justiça Eleitoral determinou nesta sexta-feira (30) a cassação do mandato de Rubinho Nunes por ter repostado o laudo falso em suas redes sociais, além de oito anos de inelegibilidade.
Defensor de Rubinho, o advogado Ricardo Vita Porto entrou com um embargo para que o juiz de primeira instância explicasse pontos que considera obscuros na decisão. Em seguida, deve recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral e, se necessário, ao TSE. O vereador segue no cargo até o trânsito em julgado do processo (quando não são possíveis mais recursos).
Porto alega que o vereador retirou o conteúdo, que teve 3.000 curtidas, 26 minutos após publicar. “Ele tomou a iniciativa assim que surgiram os primeiros indícios que o documento era falso”, diz.
Afirma ainda que as pessoas tiveram a informação sobre o laudo não só pelos perfis do político nas redes sociais. “Era uma informação que estava circulando inclusive em veículos de imprensa.”
Para o advogado, como disputavam cargos diferentes, a publicação não afetou a lisura processo eleitoral em que o vereador foi reeleito. “Além do mais, o Guilherme Boulos disputou o segundo turno mesmo após a divulgação.”
O psolista acabou sendo serrotado por Ricardo Nunes (MDB) no segundo turno da disputa.
O professor de direito constitucional e eleitoral da PUC-SP Carlos Gonçalves Junior foi um dos especialistas que citou o caso de Francischini como um precedente válido.
Apoiador de Jair Bolsonaro (PL), ele perdeu seu mandato por fazer lives em que atacava o sistema eleitoral na disputa de 2018, quando foi eleito. O caso é considerado a primeira cassação por divulgação de fake news no país.
Apesar das diferenças entre os casos, Junior considera que ambos usaram informações falsas que prejudicaram o processo eleitoral. Isso já configura motivo para a perda do mandato e a anulação dos votos, diz ele.
O advogado aponta ainda que a postagem foi feita apenas dois dias antes do primeiro turno da votação, o que dificultou a defesa de quem foi atacado.
Junior diz ainda que a inelegibilidade poderia ser aplicada a Rubinho mesmo se ele não estivesse sequer disputando a eleição. “Quem publica informações falsas sobre concorrentes se mostra improbo para disputar e ocupar cargos públicos”, diz.
Professor de direito eleitoral da Escola Mineira Direito, Renato Ribeiro de Almeida também considera que, mesmo com a disputa a um cargo diferente da vítima (Boulos era candidato a prefeito), a punição vale para o vereador.
Ele afirma que o fato de Rubinho não ser o autor original e de ter apagado a publicação 26 minutos depois não atenuam sua responsabilidade.
Também especialista em direito eleitoral, Alexandre Rollo também diz acreditar na manutenção da condenação, mas considera o caso complexo. Para ele, quem republica é responsável pelo conteúdo assim como o autor original.
A principal divergência entre eles é se o caso envolve a anulação dos votos recebidos pelo político cassado ou se o suplente deve ser convocado para assumir a vaga. Rollo defende essa segunda opção. Os demais dizem que os votos devem ser anulados e o coeficiente eleitoral ser recalculado. Com isso, o União Brasil pode perder a vaga.
Especialista em direito eleitoral, o advogado Marcelo Andrade discorda dos outros advogados e considera a pena excessiva. Para ele, o comportamento do vereador não demonstra ter potencial para justificar uma cassação e inelegibilidade.
“Não fica comprovada a intenção deliberada de publicar conteúdo falso, no aspecto qualitativo, nem o alcance de uma divulgação que ficou apenas alguns minutos no ar, no aspecto quantitativo”, afirma.
Para Andrade, o caso poderia ser tratado no aspecto da representação eleitoral, com sanção econômica, ou da ação penal, que cabe ao o Ministério Público. A posição do advogado é semelhante à do promotor eleitoral Fabiano Augusto Petean, que se manifestou pela rejeição da ação que gerou a cassação.
Fonte ==> Folha SP