SP: Ministério Público denuncia 9% de mortes por policiais – 20/07/2025 – Cotidiano

Movimentação de policiais militares em Guarujá, na Baixada Santista, durante a Operação Escudo

Policiais de São Paulo foram responsáveis por 7.920 mortes no estado de 2011 a 2023. Mas os 7.641 inquéritos viraram denúncia do Ministério Público em 691 casos, cerca de 9% do total. No Rio de Janeiro, essa proporção foi mais baixa, de 3,7%, com 147 denúncias ante 4.014 procedimentos abertos em meio a 12.789 mortes por intervenção policial no mesmo período.

Em São Paulo, os promotores pediram o arquivamento de 4.768 casos. No Rio, foram 2.029 desses pedidos.

Os dados integram a nova edição da pesquisa “Quem Controla as Polícias? A Atuação do Ministério Público Diante da Letalidade Policial”, do Fórum Justiça, organização que trabalha na área de Justiça e direitos humanos. O levantamento analisa especificamente os casos de morte dentro do trabalho de controle da atividade policial.

O Ministério Público do Estado de São Paulo levou, em média, dois anos para pedir o arquivamento e um ano e meio para oferecer a denúncia à Justiça. Já no Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, foram, em média, 1.163 dias para arquivamento e 1.199 dias para denúncia.

O cálculo fica prejudicado, diz o levantamento, porque 8 em cada 10 procedimentos de 2021 a 2023 não tinham a data do fato, o que pode distorcer o tempo levado para cada tipo de medida.

Os dados foram obtidos por meio de pedidos de Lei de Acesso à Informação feitos às unidades do Ministério Público nos estados. A pesquisa também incluiu o Ministério Público do Estado da Bahia, que disse, segundo o Fórum Justiça, “não ter dados categorizados sobre o tema”.

Procurado pela Folha, o órgão afirmou que ainda está sistematizando esse tipo de dado de acordo com resolução de abril do Conselho Nacional do Ministério Público de abril deste ano que organiza “crimes ocorridos em decorrência ou no contexto de intervenções dos órgãos de segurança pública”.

A baixa proporção de denúncias em relação aos procedimentos é um sinal de impunidade para agentes estatais que matam, segundo o advogado e coordenador executivo do Fórum Justiça, Paulo Malvezzi.

“Nossa pesquisa sinaliza, e outras pesquisas sinalizam no mesmo sentido, que a regra hoje no Brasil, e não é diferente no Rio de Janeiro, em São Paulo e na Bahia, é a irresponsabilidade dos agentes do Estado que matam.”

Para o advogado, o levantamento mostra que o controle externo da atividade policial não está sendo feito a contento. Uma situação ideal de trabalho, ele avalia, teria um acompanhamento detalhado feito por promotores desde os primeiros momentos após uma morte, a análise de laudos e de contra laudos e o acesso a todas as informações sobre esses homicídios.

Malvezzi afirma que também seria ideal a atuação de um instituto de perícia independente —tanto da Polícia Civil quanto do próprio Ministério Público—, para que houvesse mais provas do que aquelas produzidas pelas perícias policiais e que os processos não ficassem submetidos, em grande parte, aos testemunhos dos envolvidos.

Um exemplo citado por ele é o Centro de Antropologia e Arqueologia Forense da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que atuou no caso conhecido como massacre de Paraisópolis, de 2023.

Além disso, o levantamento defende a criação, em todos os estados, de grupos especializados do Ministério Público, como o Gaesp (Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial) e o Geosp (Grupo de Atuação Especial Operacional de Segurança Pública). Com dados de fevereiro de 2025, a pesquisa indica que apenas Rondônia, Tocantins, Goiás, Piauí, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul tinham esses grupos.

No caso do Rio de Janeiro, o Gaesp foi extinto, junto com outros grupos, em 2021 pelo então procurador-geral de Justiça Luciano Mattos, em meio a investigações que envolviam o senador Flávio Bolsonaro (PL), à época no Republicanos, e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos).

Na época, a justificativa foi de que estruturas especializadas desfalcam outras áreas. O grupo foi recriado em fevereiro deste ano, às vésperas da retomada do julgamento da chamada ADPF das Favelas, que discutiu o uso da força em operações policiais em comunidades no estado.

Segundo Malvezzi, o vai e volta é prejudicial. “Você consolida um conhecimento e uma estrutura, desfaz e depois recria. Tudo isso mostra que a extinção do Gaesp foi um erro sem qualquer justificativa. Agora se tenta corrigir, mas ainda não temos condições de avaliar o impacto.”

Procurado na última quarta-feira (17), o Ministério Público do Rio de Janeiro não respondeu aos questionamentos da Folha.

Também procurado, o Ministério Público de São Paulo afirmou que o controle da atividade policial é feito de forma concentrada, por meio do Gaesp, na capital —que lida com protocolos de operação das polícias, a formação dos policiais e outros temas—, e também na difusa, por meio do trabalho de cada promotor de Justiça, com aberturas de inquérito após mortes cometidas por policiais.

Uma nova unidade de Gaesp está prevista para a Baixada Santista, após a experiência de apuração de mortes causadas por policiais nas operações Escudo e Verão, segundo o órgão.

“O MPSP instaurou um Procedimento Investigatório Criminal para cada uma das mortes decorrentes de intervenção policial, realizando uma investigação independente daquela feita pela Polícia Civil do Estado de São Paulo, apurações estas que fundamentaram o oferecimento de sete denúncias contra 13 policiais militares”, destaca.

O órgão também citou o trabalho do Centro de Apoio à Execução, que faz perícias. “Toda vez que o promotor de Justiça detecta insuficiência na investigação, toma as medidas cabíveis, viabilizando, assim, o oferecimento da denúncia.”

Já o Ministério Público da Bahia aponta dificuldades estruturais na atuação em casos de mortes causadas por policiais. “Há fragilidades nos protocolos de atuação, seja no momento imediatamente após a ocorrência, como a preservação da cena do crime e da cadeia de custódia da prova e produção de provas técnicas confiáveis com brevidade.”

Entre os projetos listados pelo órgão para enfrentar a letalidade estão um grupo de trabalho para criar normas de atuação da Promotoria, a construção de um plano de diagnóstico, monitoramento e fiscalização da letalidade e um projeto para avaliar a atuação das instituições em investigações sobre o tema.



Fonte ==> Folha SP

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