Teatro israelita do Bom Retiro faz campanha para reabrir – 30/05/2025 – Ilustrada

A imagem mostra o interior de um teatro abandonado, com assentos vermelhos dispostos em várias fileiras. O palco está visível na parte inferior, e há uma área superior com mais assentos. As paredes são de um tom verde desgastado, e a iluminação é fraca, com algumas luzes no teto. O ambiente parece estar em estado de deterioração, com marcas e sujeira visíveis nas paredes e no chão.

Na abertura do livro “TAIB: Uma História do Teatro”, o diretor artístico da Casa do Povo, Benjamin Seroussi, assume o compromisso de criar mais uma camada de tempo para o Teatro de Arte Israelita Brasileiro, localizado no subsolo do espaço ligado à comunidade judaica progressista, no Bom Retiro, região central de São Paulo.

Os próximos capítulos da história do Taib passam pela restauração do local, fechado desde o ano 2000 e um lugar de resistência das artes cênicas e da sociedade civil a várias formas de autoritarismo.

Para que isso aconteça, Seroussi, um francês de mãe polonesa e pai tunisiano, há duas décadas morando no Brasil, lidera uma ambiciosa campanha de arrecadação, com meta de R$ 17 milhões —desse total, R$ 7 milhões são necessários para que o teatro volte a funcionar em 2027. O dinheiro será usado também para atualizar a infraestrutura da Casa do Povo.

Uma das etapas da campanha, “Ato 2”, será realizada neste sábado (31), às 19h, no canteiro e obras da Casa do Povo, com jantar do chef Rodrigo Freire, do restaurante Preto Cozinha, a instalação performática “Bosque”, da coreógrafa Clarice Lima, e apresentação dos músicos Tom Monteiro, Podeserdesligado e Gil Fuser. Os ingressos custam R$ 2.000.

A campanha também oferece cotas de apoio de R$ 15 mil a R$ 450 mil para empresas ou pessoas físicas. Até o momento foram arrecadados R$ 3,3 milhões, o que tornou possível o início das obras.

“Desde 1960 a história do Taib é a de um teatro ao mesmo tempo experimental, popular e comunitário. O futuro pretende beber nesta fonte, mas em diálogo com a cena contemporânea”, diz o diretor. “A Casa do Povo já é de diversos grupos com uma produção fronteiriça entre as artes visuais, a dança, o teatro, a performance e a música. É uma produção que muitas vezes não se encaixa em salas de espetáculo tradicionais, apenas em festivais. Neste sentido, reinventar o Taib é criar uma sala que consegue, de forma contínua e ao longo do ano, fomentar a criação e formar o público”.

Os arquitetos André Vainer, Silvio Oksman e Ilan Szklo lidam com o desafio de atualizar o prédio construído na década de 1950 e, ao mesmo tempo, manter as ideias de seus criadores, Ernst Carvalho Mange, responsável pela Casa do Povo, e Jorge Wilheim, que assinou o projeto arquitetônico do Taib.

A reforma busca preservar a memória de um espaço que faz parte da história do teatro judaico e brasileiro, e também renovar um edifício impactado pela decadência da região central.

“Na prática, nosso desafio é transformar um palco italiano em caixa preta, sem descaracterizar o espaço e respeitando a sua história”, diz Seroussi.

O projeto começou em 2019, com a campanha “TAIB 60”, referência aos 60 anos do espaço. A pandemia prejudicou a arrecadação e a mobilização voltou no ano passado, agora chamada “TAIB Presente”. O primeiro ato teve projeção de vídeo de Yael Bartana filmado no próprio teatro e apresentação do Ilú Obá de Min.

Inaugurado em outubro de 1960, inicialmente como palco para o teatro ídiche, o Taib se transformou ao longo do tempo em sede da vanguarda das artes cênicas paulistanas. Abrigou o Teatro Popular do Sesi, entre 1966 e 1972, peças do Teatro de Arena e produções de Ruth Escobar, Antônio Abujamra, Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri e Renato Borghi.

“A comunidade judaica em São Paulo foi fundada fazendo teatro ídiche, estudando e lendo teatro, e encenando peças”, afirma o historiador e escritor Roney Cytrynowicz em um dos capítulos do livro sobre o Taib. Segundo ele, peças com temas históricos ajudavam a reafirmar as raízes judaicas.

Após a Segunda Guerra Mundial, cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Santos e Campinas tinham um público interessado nesse tipo de teatro e viraram destino para artistas da Polônia e da Europa Oriental que sobreviveram ao nazismo. Entre 1950 e 1956, foram encenadas 174 peças ídiche em São Paulo.

A fundação do Taib foi uma consequência do auge da cultura idiche no Brasil. A partir do final da década de 1960, no entanto, houve um declínio e o teatro passou a ser ocupado por grupos que faziam experimentações artísticas e resistiam à ditadura militar.

Ali foram apresentadas peças como “Ponto de Partida”, de Gianfrancesco Guarnieri, que denunciou o assassinato de Vladimir Herzog, em outubro de 1975, no DOI-Codi, na Vila Mariana.

Em outra fase, em 2012, a encenação de “Bom Retiro 958”, do Teatro da Vertigem, terminava entre os destroços do Taib, em uma das ocasiões em que o local recebeu público após o fechamento.

“No dia em que o Taib for restaurado, como não apagar esse passado de ruína no qual deixamos ele se transformar? As ruínas, como os fantasmas, nos alertam para aquilo que um dia abandonamos, destruímos ou simplesmente deixamos de olhar”, diz Antônio Araújo, diretor do Teatro da Vertigem.

Em 2021, o espaço recebeu o espetáculo-instalação “Leste”, com direção e dramaturgia de Martha Kiss Perrone, em uma mistura de teatro, cinema e música inspirada na peça ídiche “Um Sonho de Goldfadn”, do diretor judeu-polonês Jacob Robaum.

“De forma concreta, o Taib será uma continuação do que já fazemos no resto da Casa do Povo, onde muitos grupos já se reúnem, ensaiam e se apresentam. Agora teremos um espaço com controle de luz e de som, algo inédito no resto do prédio”, conclui Seroussi sobre a restauração histórica.



Fonte ==> Folha SP

Leia Também

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *