TikTok expõe crianças a conteúdos impróprios em 30 minutos – 24/04/2025 – #Hashtag

TikTok expõe crianças a conteúdos impróprios em 30 minutos - 24/04/2025 - #Hashtag

Em menos de 30 minutos, um perfil fictício criado no TikTok com idade declarada de 13 anos foi exposto a conteúdos com violência contra a mulher, sexualização e bullying.

A experiência foi realizada pelo #Hashtag para verificar o tipo de conteúdo direcionado a contas que informam a idade mínima exigida pela plataforma. Não houve qualquer interação com outras publicações, para não influenciar o algoritmo.

A primeira publicação entregue na aba “para você” mostra uma mulher coando café em uma calcinha, que depois é servido a um homem. “Quando a relação começa a ‘esfriar'”, diz o texto.

Em outro vídeo, uma jovem lava a louça enquanto uma voz gerada por inteligência artificial diz: “Comigo é assim: se eu chegar em casa e a mulher não tiver lavado a louça, eu já desço a porrada. Tem que lavar e fazer o almoço para não apanhar.”

Outras publicações mostram adolescentes utilizando celular durante as aulas, escondendo os aparelhos sob as carteiras, dentro das bolsas ou até mesmo nos estojos escolares. Esses conteúdos são uma crítica à nova legislação que restringe o uso de celular em escolas —a lei nº 15.100/2025, em vigor desde janeiro.

Em uma das gravações, um estudante é flagrado assistindo a uma corrida de Fórmula 1 com o celular posicionado dentro do estojo. Em outro registro, um aluno recorre a outra tática, colocando aparelho no chão e usando os dedos dos pés para rolar a tela.

Pelo menos seis postagens exibem estudantes afirmando ter levado cadeiras escolares para casa em protesto. Em uma delas, a legenda diz: “Dia 4 pegando cadeiras na escola até devolverem meu celular.”

“Fiz bullying até com o professor”, diziam dois vídeos analisados no período. As menções ao bullying traziam conteúdo majoritariamente gordofóbico. Em um dos exemplos, um usuário escreve: “A gorda que acredita em signos. Ela: ‘eu sou libra’. Eu: ‘libra não, jovem, você é tonelada’.”

A maioria das postagens apresentava ambientação escolar, com alunos dentro das salas de aula ou em outros espaços da instituição. “O banheiro da minha escola tá ficando importante, tudo que não pode na sala pode no banheiro (pod, celular e muito mais)”, constava em um vídeo.

“Pod” vem do inglês pod system e se refere ao modelo de cigarro eletrônico que utiliza cápsulas ou cartuchos (os “pods”) com nicotina e aromatizantes. A comercialização, importação e propaganda de todos os tipos de dispositivos eletrônicos para fumar são proibidas no Brasil desde 2009.

O TikTok afirma à Folha que as diretrizes da comunidade são rigorosas e determinam que não é permitido promover atividades que possam levar a um dano físico.

“São dezenas de milhares de profissionais no mundo todo trabalhando para manter a plataforma segura e, dos mais de 5 milhões de vídeos removidos no Brasil entre julho e setembro de 2024, 98,8% foram removidos proativamente pela moderação da plataforma”, informa em nota.

A mediação das redes sociais voltou ao debate público quando uma menina de 8 anos morreu no Distrito Federal após supostamente inalar desodorante em spray, o que teria sido inspirado por um “desafio” de rede social. O caso ocorreu no início de abril.

O TikTok alega não haver evidências de que esse seja um “desafio” presente no aplicativo. “Não identificamos nenhum conteúdo viral ou trend relacionada ao tema na plataforma”, diz a empresa.

Durante o período de 30 minutos analisado pelo #Hashtag, não foi visto nenhum tipo de desafio entre os conteúdos publicados.

Carla Cavalheiro Moura, coordenadora do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria da USP, afirma que as crianças cuja presença no ambiente virtual é irrestrita, têm a percepção dos perigos comprometida.

O córtex pré-frontal, área do cérebro responsável por avaliar riscos, é o último a se desenvolver por completo, o que ocorre por volta dos 25 anos, explica a especialista.

“A criança e o adolescente não conseguem fazer essa antecipação de consequências. Eles estão vivendo agora. E muito disso tem a ver com essa falta de maturação cerebral”, diz.

Pelo Marco Civil da Internet, em vigor desde 2014, as empresas só são responsabilizadas por conteúdos de terceiros se não cumprirem ordem judicial para removê-los, exceto em casos de vazamento de conteúdo íntimo ou violação de direitos autorais.

No cotidiano, a tarefa de moderar os conteúdos publicados fica sob responsabilidade das próprias empresas.

“Não é mais possível que as plataformas não sejam responsabilizadas pelos conteúdos que elas veiculam”, afirma Paulo Faltay, coordenador do Laboratório em Tecnopolítica, Comunicação e Subjetividade da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Segundo ele, se um modelo de negócio é baseado em algoritmos, cabe às próprias plataformas adequar os conteúdos às diferentes faixas etárias. No entanto, essa regulação sozinha não resolve o problema. “A legislação não vai ser a panaceia desses problemas. Aí também entra como a gente vai se relacionar com a tecnologia e com a educação midiática.”

De acordo com a psicóloga Carla Moura, embora não exista uma norma que estabeleça uma idade mínima para o uso de celular, o bom senso deve prevalecer. Para ela, “13 anos é uma idade razoável para dar o celular.”

No entanto, ela ressalta que mais importante é refletir sobre o uso do aparelho. “Para que o filho precisa de um celular? Se for apenas para ouvir música ou falar com os pais, existem opções que não envolvem acesso às redes sociais.”

O remédio para o problema é o equilíbrio, acredita a especialista. “Não é o caso de demonizar, é o caso educar, de ir construindo a crítica e a consciência digital”, sugere.


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Fonte ==> Folha SP

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