Trumpistas tomam controle do Departamento de Estado – 28/05/2025 – Mundo

A imagem mostra um boné vermelho com a frase

Houve choque generalizado em Washington no mês passado quando Lew Olowski, um funcionário pouco conhecido e de baixo escalão, foi nomeado diretor-geral interino do serviço exterior dos Estados Unidos —um dos cargos de liderança mais altos dentro do Departamento de Estado.

Ex-advogado de segurança nacional, Olowski ingressou na diplomacia há apenas quatro anos. Em sua nova função, normalmente ocupada por um diplomata veterano, ele atua, na prática, como chefe de recursos humanos de um dos maiores órgãos do governo dos EUA.

Foi como “colocar um oficial militar júnior no comando do sistema de pessoal do Pentágono”, disse o AFSA, sindicato do serviço exterior.

Mas Olowski tinha um trunfo: sua filiação à Ben Franklin Fellowship (BFF), uma rede conservadora de diplomatas ativos e aposentados que vem ganhando espaço no Departamento de Estado desde que Donald Trump retornou à Casa Branca.

A BFF diz ser apartidária, mas não esconde seu apoio à agenda “America First” de Trump. Em um post de blog no fim do ano passado, Phil Linderman, presidente do grupo, escreveu que o papel da organização era orientar os profissionais de carreira do Departamento de Estado “em direção a uma diplomacia que promova a soberania americana, fronteiras nacionais fortes, práticas comerciais justas e ceticismo quanto ao multilateralismo”.

Linderman afirmou que os “funcionários alinhados com Trump e conservadores” são uma minoria no Departamento, mas estão presentes —e agora estão sendo promovidos a cargos de alto escalão em toda a estrutura.

O Financial Times identificou 11 membros da BFF que assumiram cargos seniores desde a posse de Trump. Um deles é Christopher Landau, embaixador dos EUA no México durante o primeiro mandato do republicano, agora nomeado vice-secretário de Estado.

Outros membros também foram escolhidos para funções que vão de subsecretários interinos a secretários-adjuntos e chefes de departamento —um índice de sucesso notável para uma organização criada apenas no ano passado.

Segundo um funcionário, para muitos dos membros da BFF agora promovidos, a principal — e talvez única —qualificação é concordarem com a agenda de Trump. Nas palavras desse servidor, o departamento está se corroendo por dentro.

Alguns chegaram a chamar a BFF de “deep state Maga” —uma designação que Simon Hankinson, um dos fundadores da irmandade, rejeita.

“Para nós, a última coisa que queremos seria restabelecer uma deep state —é exatamente o que combatemos”, disse Hankinson, ex-funcionário do Departamento de Estado e hoje pesquisador sênior no centro de segurança de fronteiras e imigração da Heritage Foundation, ao FT. “E a expressão Maga carrega um peso negativo enorme.”

Ele também rebateu as críticas de que a BFF seria composta por diplomatas brancos ressentidos com as políticas de diversidade, equidade, inclusão e acessibilidade do Departamento. Um funcionário chegou a chamar a entidade de vingança do homem branco medíocre.

Hankinson disse que “as mulheres têm sido promovidas em ritmo superior ao dos homens nos últimos 20 anos” no Departamento, mas insistiu que não deseja substituir uma forma de discriminação por outra. “O que realmente queremos ver é o retorno à meritocracia e à igualdade de oportunidades — em vez de igualdade de resultados.”

Os fundadores da irmandade se orgulham da influência crescente do grupo e dizem querer repetir o sucesso da Federalist Society, a rede conservadora que forneceu muitos dos juízes indicados por Trump durante seu primeiro mandato.

Em seu post, Linderman afirmou que os organizadores da BFF estão “seguindo o manual” da Federalist Society.

As mudanças de pessoal no Foggy Bottom — bairro de Washington onde está o Departamento de Estado — passaram despercebidas pelo público em geral, ofuscadas por outras decisões mais visíveis da pasta.

Entre elas, está o fechamento da Usaid (Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional), órgão com 10 mil funcionários e um orçamento de US$ 44 bilhões, considerado um símbolo do soft power americano.

Há também forte indignação entre a elite da política externa dos EUA com a colaboração do Departamento nos programas de deportação de Trump e nas prisões de estudantes envolvidos em protestos nos campi universitários. O secretário de Estado, Marco Rubio, se orgulha de ter revogado milhares de vistos estudantis desde a mudança de governo.

As mudanças de pessoal também vêm gerando preocupações. Gregory Meeks, democrata sênior do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, acusou Rubio de “substituir profissionais experientes por leais políticos, minando um dos princípios fundamentais do Serviço Exterior”.

Segundo ele, um dos casos mais gritantes foi a nomeação de Olowski — ex-advogado da fundação ligada a Tucker Carlson, a The Daily Caller News Foundation — como chefe do Bureau of Global Talent Management. Ele substituiu Marcia Bernicat, diplomata veterana e mulher negra.

Rubio “nomeou um funcionário de nível inicial com apenas uma missão internacional para liderar a gestão de talentos globais, no lugar de uma embaixadora experiente com décadas de serviço, que por acaso era uma mulher negra”, afirmou Meeks. “Isso não é uma questão de raça — é de experiência, integridade e qualificações mínimas.”

Um porta-voz do departamento afirmou esperar que todos os funcionários — membros da BFF ou não — trabalhem todos os dias para promover a agenda de Trump.

O presidente nunca escondeu seu desprezo por um suposto “deep state” que, segundo ele, teria bloqueado seu primeiro mandato, e deixou claro que deseja alinhar o Departamento de Estado a seus objetivos Maga, inclusive demitindo altos funcionários considerados desleais.

Em declaração após sua posse, a Casa Branca ordenou que as “políticas, programas, pessoal e operações” do Departamento fossem ajustados a uma “política externa America First, que coloca os EUA e seus interesses em primeiro lugar”.

Esse processo começou ainda antes de Trump reassumir o cargo, com suas equipes de transição pedindo a demissão de grande número de diplomatas de carreira. Essa medida foi considerada incomum: normalmente, apenas os nomeados políticos se demitem com a chegada de um novo presidente, enquanto diplomatas de carreira permanecem nos cargos de uma gestão para outra.

Os afastados eram “servidores públicos apartidários” com “décadas de serviço prestado a republicanos e democratas, essenciais para a segurança nacional dos EUA”, segundo a senadora democrata Jeanne Shaheen.

Algumas nomeações políticas também causaram polêmica, até mesmo entre republicanos. Darren Beattie, nomeado subsecretário interino de diplomacia pública e assuntos públicos em fevereiro, foi redator de discursos de Trump no primeiro mandato, mas deixou o cargo em 2018 após ser revelado que havia discursado em uma conferência com nacionalistas brancos. No ano passado, declarou no X que “homens brancos competentes devem estar no comando se quiser que as coisas funcionem”.

Rubio defendeu a nomeação, dizendo que Beattie foi convocado “por seu compromisso em acabar com os programas de censura que estavam sendo operados no Departamento”.

Diplomatas dizem, em privado, que veteranos experientes estão se aposentando ou pedindo demissão em massa, alarmados com a politização da pasta. Segundo um deles, o departamento está sendo tomado por radicais perigosos.



Fonte ==> Folha SP

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